Saturday, September 05, 2009

Para o 01 de Setembro e nossas escolhas

No fluxo diário e muitas vezes insano de informações passou como algo desimportante a data do primeiro de setembro para muita gente. Enquanto alguns comemoravam a data de nascimento do Corinthians e outros a lamentavam, um número talvez maior de pessoas pelo Brasil teve a sua atenção despertada mais para os confrontos entre a PM de SP e os moradores da favela de Heliópolis.

Mas o primeiro de setembro foi lembrado na Europa com o encontro tradicional de vários líderes europeus. A presença da Alemanha e da Rússia tornou as opiniões mais acaloradas. Os alemães incansavelmente tomam atitudes para deixarem claro que o Nazismo foi um grande erro histórico do qual não negam responsabilidade e nem o compromisso de não repetí-lo.

Mas as cerimônias para a lembrança desse fato ocorrem por uma única razão: não esquecer para não repetir. E entre tantos atos desumanos e abusos de Estado, uma lição que a II Guerra Mundial deu à humanidade foi a de que somos responsáveis por nossas escolhas.

O povo alemão escolheu o Nazismo. Hitler foi bem votado e a elite política do país o aceitou. Culpar Hitler por tudo é pouco. A grande questão é: por que os políticos que poderiam detê-lo não o fizeram? Por que os militares alemães, bem treinados, preparados e com longa experiência em guerras aceitaram obedecê-lo? A resposta é simples: eles aceitaram.

Mas se Itália, Alemanha e Japão escolheram o imperialismo, o discurso dos aliados foi o da repulsa. Haverá sempre uma longa lista de razões para entendermos a entrada dos EUA e da URSS no conflito. Mas uma delas é concreta e inquestionável. Muita gente nos EUA e na URSS deram a vida na luta contra aquilo que julgaram o pior para a humanidade, que era justamente a expansão do nazifascismo. Autoridades dos EUA e Rússia hoje se apresentam no papel daqueles que fizeram a escolha certa.

Desde o final da II Guerra Mundial a questão da escolha tornou-se um tema relevante. Seja lá quais forem nossas opções políticas, ideológicas, religiosas, cargos políticos, profissões, famílias e sociedades, todos temos certas obrigações e limites. E desde então as pessoas que lutam pelo que acreditam ser o melhor para o mundo entendem que existem certas práticas que jamais se justificam. Há crimes contra uma pessoa ou contra um povo que podem ser classificados como crimes contra a humanidade. Tortura, prisões em campos de concentração e assassinatos em massa são alguns deles.

A questão das escolhas ultrapassou os limites da política. Tornou-se também uma discussão moral, necessária. J.K. Rowling, autora de Harry Potter, deixa isso claro nos livros que tanto agradaram o mundo. Os bruxos não nascem maus, mas fazem suas escolhas. Num dos filmes, Dumbledore, o mestre de Harry diz: "...tempos difíceis se aproximam, e devemos começar a escolher entre o que é certo e o que é mais fácil...".

A senhora Rowling é inglesa e nada burra. Sabe muito bem o que escreve e para quem escreve. Sabendo que atingiria tantas crianças, jovens e adultos, sentiu-se responsável e na obrigação de transmitir valores saudáveis. Rowlling é formada em letras clássicas por Oxford e faz parte da geração de ingleses que ouviram de seus pais, avós e professores o que foi a II Guerra Mundial para os ingleses. Para ela a II Guerra Mundial não foi apenas um fato histórico, mas um episódio que tirou vidas, separou famílias e provocou muita dor. Rowilng escolheu defender idéias humanistas. Ninguém a obrigou a isso. Simplesmente escolheu.

As escolhas que fazemos são perigosas, pois nunca optamos por aquelas que gostaríamos de ter elegido como possíveis. Na maior parte dos casos a vida nos coloca diante de circunstâncias nas quais não temos muito tempo para maiores reflexões. Arriscamos um lado sabendo que podemos ter feito a pior escolha e de que, em muitos casos, a opção foi irreversível. Assim fazemos com nossas profissões, amizades, passeios, religião e companhias. Podemos nos arrepender. Às vezes, amargamente. Àsvezes nos orgulhamos. Outras vezes morremos na dúvida.

Os professores fazem suas opções sobre seu estilo, formas de abordagens e conteúdos. Haverá sempre algo a dar maior destaque. Assim como algo a ser descartado. Os professores também podem ou devem ser julgados pelas opções que fizeram.

Jornalistas também. Ingressar numa empresa é se colocar entre aquilo que é importante para uma carreira e aquilo que é compatível com a consciência. Haverá situações nas quais contrariar princípios será inevitável. Isso também vale para jornalistas, policiais, professores e médicos.

No dia 01 de setembro de 2009 parte da população de Heliópolis se rebelou. Uma jovem mãe de 17 anos foi assassinada por policias da Guarda Civil de São Caetano do Sul.

Um dos guardas muncipais já havia sido expluso da PM de SP. Mas a prefeitura de São Caetano do Sul o contratou mesmo assim.

Os guardas perseguiam um carro roubado, segundo sua versão. Poderiam ter escolhido entre evitar riscos à população da favela ou atirar para matar um suspeito. Escolheram atirar e colocar em risco a vida de outras pessoas. Uma inocente morreu com um tiro no pescoço.

A população da favela poderia ter escolhido o silêncio e a passividade. Sabiam que eram vítimas históricas do preconceito, descaso e dos abusos de autoridade. Sabiam que a PM de São Paulo não gosta de pobre, negro e nordestino. Podiam ter ficado em suas casas, assistindo o Jornal Nacional. Ou então poderiam ir para um bar, reclamar do governo e da PM, tomando pinga e sem atitude prática alguma. Mas escolheram outro caminho. Muita gente ficou indignada. Para tudo deve haver um limite. E o medo da PM, assim como a passvidade involutária acabaram cedendo lugar à revolta. Espontânea, errática, aleatória. Mas nem por isso menos intensa e determinada. Algo deveria ser feito. Aquele cirme estúpido não poderia ter ocorrido. E outros não deverão ocorrer. Depredação, incêndio e um sentimento implícito: basta.

A PM de São Paulo não teve escolha. Manifestações daquelas devem mesmo ser contidas. Mas como uma polícia reconhecidamente violenta com aquelas pessoas iriam negociar? A relação de conflito e repressão é antiga. Não era hora de vacilar. E a PM escolheu a repressão, mais uma vez.

Uma ação da PM desse porte e nessas circunstâncias nunca é decidida de forma isolada. Um comandante avalia a situação, ouve seus subordinados e toma a decisão: reprimir. Mas um comandante da PM nunca é alguém idiota. Sabe que suas decisões poderão ter consequências graves. Talvez mais mortes. E por isso os comandantes da PM consultam a secretaria de Segurança Pública.

O secretário de Segurança dá a palavra final. É forçado tanto pelas circunstâncias quanto pela ferocidade de comandantes que às vezes gostam do papel de repressores. O secretário poderia questionar, afastar policiais que julgasse abusivos em suas decisões. Mas escolheu aceitar a independência da PM de SP. Aquela que dá as cartas, faz o cheque e manda que os civis, covardes, assinem. A repressão em Herliópolis foi também uma escolha da Secretaria de Segurança Públcia de SP. Do jeito que ela ocorreu.

A Globo teve várias opções de escolha. Poderia ter entrevistado os moradores e ouvido os policiais. Poderia fazer um trabalho de jornalismo investigativo. De quem era o carro roubado? Era mesmo roubado? Quem eram os policiais municipais na operação? Teriam a ficha limpa? Seriam suspeitos de outros abusos?

Mas a Globo escolheu a versão da PM. Preferiu noticiar os conflitos sob o ponto de vista de quem se senta no banco de trás da viatura da polícia. À distância e sempre ouvindo um lado só do problema.

A Globo recebeu um bilhetinho idiota, mal escrito e com toda a evidência de ter sido forjado. Poderia ter questionado e até divulgado o nome ou o cargo de quem lhe entregou o bilhetinho falso. Um bilhete que conclamava a população a se rebelar em troca de cestas-básicas. Algo como: "...enfrente a PM, arrisque tomar um tiro na cara ou borrachada nas costas. Faça isso e lhe daremos uma cesta-básica..."

A Globo revelou que para ela as pessoas pobres não são capazes de agirem sozinhas. Precisam de alguém a lhe dar ordens. Pensa assim porque age assim. Para ela, o que ela noticia é verdade, para todos.

A Globo escolheu divulgar a versão mais inverossímel. Mas foi a sua escolha.

Mas quem é a Globo? Apenas uma emissora de Televisão. A maior rede privada de notícias do Brasil.

Sim, Hilter também era o maior líder que a Alemanha já havia colocado no Poder até então.


Hitler, os alemães, seus soldados, a Globo e seus jornalistas fizeram suas escolhas.

A história da Alemanha e de Hitler conhecemos. A da Globo estamos testemunhando.



Para as fantasias do Jornal Nacional:


Para a cerimônia dos 70 anos do início da II Guerra Mundial:

http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2009/09/090901_polonia_guerra_tp.shtml

Tuesday, July 14, 2009

Dando um tempo

Para o bem da cabeça e para redução do lixo virtual que se acumula na internet, o palpiteiro ficará fora do ar até o próximo dia 23/07.

Grande abraço a todos e bom descanso.

Sunday, July 12, 2009

McNamara morreu nos EUA em Julho de 2009

As notícias dos últimos dias sobre a morte de Michael Jackson desviaram a atenção sobre uma outra morte ocorrida no mês de Julho, no dia 5.

Robert McNamara morreu aos 93 anos. Robert Strange McNamara era descendente de irlandeses e relativamente pobre para os padrões dos EUA. Mas era muito inteligente. Conseguiu se tornar universitário com poucos recursos da família e bolsas de estudo concedidas a estudantes de destaque.

Durante a Segunda Maldita Guerra Mundial foi convocado para as forças armadas. Fez parte da elite que introduziu modernos métodos estatísticos para o recrutamento de soldados e estudos de eficiência militar. McNamara ajudou a convencer o comando do Exército dos EUA que Tóquio era uma cidade de madeira, e que valia a pena arriscar a vida de alguns pilotos americanos para lançar bombas incendiárias sobre a cidade. Numa única noite bombas incendiárias foram lançadas e mais de 200.000 mil japoneses morreram. Esses números foram abafados pelo impacto das bombas de Hiroshima e Nagasaki. Mas o incêndio de Tóquio matou tantas pessoas quanto um ataque nuclear. McNamara disse, décadas depois, que se os EUA tivessem perdido a guerra ele e outros americanos deveriam se condenados como criminosos de guerra. Questionou por que era considerado imoral matar quando se perde uma guerra, e por que o mesmo não ocorre para aqueles que vencem uma guerra, matando o mesmo número de pessoas.

Ele também foi um dos responsáveis pelo desastre dos EUA no Vietnã. O que parecia ser um passeio de uma superpotência sobre um país rural de terceiro mundo se transformou em derrota, vergonha e retirada. Na década de 1990, McNamara admitiu o grande erro que foi a guerra contra o Vietnã.

Quem tiver curiosidade pode conhecer McNamara num documentário chamado "Sob a Névoa da Guerra". O palpiteiro já o assistiu mais de 5 vezes e o utilizou em cursos e palestras. As informações acima foram quase todas retiradas desse documentário.

McNamara também foi presidente da Ford, e foi dele a idéia de colocar cintos de segurança nos automóveis, equipamento obrigatório em qualquer carro hoje em dia.

Mas McNamara era antes de tudo um ser político. Fez coisas louváveis e teve atitudes odiosas. Exaltá-lo ou demonizá-lo será sempre uma tarefa difícil. Mas fica aqui o registro. Mais importante do que o maníaco de Neverland, e muito menos lembrado. Ou seja, mais um caso de persongem que age nas sombras, muda a história da humanidade e que a mídia prefere ignorar. Quantos são os sucessores de McNamara hoje? Onde vivem? O que pensam? O que lêem?

Certamente não o noticiário superficial, que se empolga com funerais espetaculares...

Saturday, June 27, 2009

Gripe

Melhor do que interpretações, é ir direto à fonte.

O palpiteiro acessou o sítio da Organização Mundial da Saúde e encontrou esse mapa com a evolução do número de casos de gripe suína, ou gripe A, como querem alguns.

Vale a pena conferir. Trabalho bem feito com mapa bonito e interativo.



Se for o caso, mais um palpite sobre a doença.

A Morte de Michael Jackson e a crise dos EUA

O palpiteiro nunca admirou Michael Jackson, mesmo tendo dançado algumas músicas melosas da fase Jackson Five dele, na década de 1980. Era comum na época. E valia mais a companhia do que a música. Íamos aos bailinhos e a música de Michael Jackson era tão importante para a maioria das pessoas quanto aquela que toca nos elevadores ou na sala de espera dos médicos e dentistas. Havia quem gostasse muito. E eram essas pessoas que compravam os discos dele.

Com a morte dele, os urubus de plantão tentam arrumar uma forma de promoção de suas palavras, na onda do cadáver. Vale tudo, até mesmo comparar Jackson aos Beatles ou a Elvis Presley. Tem gente querendo que pegue a expressão "o rei do Pop".

Mas o que é a música Pop?

É um fenômeno da indústria americana. Antigamente se fazia música para execução ao vivo apenas. O Blues, Jazz, Country, a música clássica européia, o Samba e a música caipira brasileira nasceram socialmente. Alguns tocavam e outros ouviam, cantavam e dançavam juntos.

O século XX mudou nossa relação com a música. Rádios, discos e, mais tarde, a TV, tornaram possível levar uma mesma música a milhões de pessoas. Em diversos países. E a indústria dos EUA viu que poderia ganhar muita grana com isso.

Na era do fordismo, nada mais natural do que massificar a música. A massificação é lucrativa. Gravar apenas um disco de um único artista e vender aos milhões é mais barato do que dar espaço a vários artistas de diferentes estilos e culturas. Assim nasceu a música Pop, para vender. O segredo é pegar um músico ou intérprete com talento, carisma e de preferência bonito. Hoje ter beleza e carisma tornou-se até mais importante do que o talento.

Em Detroit, Michigan, nasceu uma gravadora chamada Motor Town Records. Mais tarde tornou-se a Motown, uma abreviação do nome original.

Foi justamente a Motown que popularizou artistas negros antes relegados a seus grupos específicos. Pois até a década de 1950 havia muito racismo nos EUA a segregar a música de brancos da música de negros. A força criativa e ritmica dos negros americanos, combinada com uma postura profissional mais adequada mudou essa história. Gradativamente deixou de ser feio um branco ouvir música de negro.

Mas a indústria da música percebeu que a criação de mitos impulsionava ainda mais as vendas. Foi assim com Elvis Presley na década de 1950 e com os Beatles na década de 1960. Por isso todas as gravadoras buscavam os mitos que renderiam rios de dinheiro. Uma relação de idolatria é conveniente. Pois o consumidor já não compra mais o disco pela música, mas por fidelidade espiritual ao que idolatra. Ter todos os discos de Michael Jackson ou de qualquer outro cantor tornou-se questão de afirmação de grupo.

A música Pop cumpriu bem o seu papel até a década de 1980, não por acaso, o auge da carreira de Michael Jackson. Artistas vendiam mais do que discos. Roupas, automóveis, sapatos, jaquetas e até luvas brancas. Tudo relacionado ao cantor Pop podia ser negociado. Michael Jackson não era o único a explorar esse mercado. Era apenas o mais bem sucedido.

Mas o mundo mudou lentamente. Na década de 1970, americanos de Los Angeles, Nova Iorque e ingleses de Londres perceberam que a música tinha alcançado um nível de prostituição muito alto. Grandes concertos, efeitos especiais e o tratamento quase religioso dado alguns cantores e bandas começaram incomadar muita gente. E foi na Inglaterra que a coisa explodiu. Um oportunista chamado Malcon McLaren percebeu que havia desemprego, falta de perpspectiva social e insatisfação entre os jovens ingleses. Andou por NY e teve contato com uma banda escrachada mas de mensagem forte chamada Ramones. Quando voltou a Inglaterra descobriu que podia ganhar uma grana com a rebeldia.

Mc Laren criou os "Sex Pistols" utilizando alguns princípios da música Pop. Jovens com algum carisma, liderança, autenticidade. E com uma postura que empolgava. Musicalmente péssimos. Mas com uma mensagem de anarquia e liberdade que foi uma novidade. O Punk explodiu na Inglaterra com essa bandeira "sem deuses, nem mestres" e com o princípio do "faça você mesmo". Nada de idolatrar mitos musicais. Se você quiser, faça a sua própria música ou arte. Foram os Sex Pistols que usaram pela primeria vez na BBC a expressão FUCK, hororizando a sociedade londrina.

Deu certo o negócio, não a banda. Os Sex Pistols duraram menos de 3 anos. Mas a idéia pegou. Rebeldia e descaso com o que os outros iriam pensar deream lucro. E impulsionaram mais vendas de discos.

Pelo lado dos EUA muitas cosias já tinham mudado. Detroit já estava ameaçada pela indústira japonesa, coreana e européia. Fábricas fecharam, empregos sumiram e os EUA foram perdendo a capacidade de trazer novos rítimos e tendências musicais. A indústria fonográfica insistiu o quanto pode na música Pop, mas estava próxima do esgotamento.

O golpe fatal na música Pop veio nos anos 2000. Criar mitos ficou difícil com o avanço das novas tecnologias. Não adiantava mais fingir que Michael Jackson era um deus. Uma câmera digital aqui, um blog malicioso acolá, algum imagem no Youtube e o estrago já estava feito: tratava-se mesmo de um ser humano. Talvez um dos mais esquisitos, mas ainda humano.

As facilidades de obtenção de música por MP3, Ipod, Cds e DVDs piratas fizeram as vendas de discos despencarem. O mercado de música foi pulverizado. Michael Jackson vendeu cerca de 750 milhões de cópias de discos. Quando? Faça essa pergunta. Quantas cópias vendia dias antes de sua morte?

A cada menção de Jackson como o "rei do Pop" fica evidente o canto do cisne. O ato final de uma indústria musical que se não morreu, ao menos teve que mudar. Pois quem, no mundo hoje, consegue vender mais de 1 milhão de cópias de CD? Quem você conhece hoje que lhe tenha dito que comprou na semana passada um novo CD?

Curioso momento esse. Uma crise financeira que coloca os EUA na defensiva e a morte de um dos seus maiores símbolos de vendas.

Michael Jackson foi um produto que tem agora a sua data de validade quase vencida, pois está vendendo discos como hámuito não o fazia. Mas as pessoas logo o esquecerão. Já não atende mais as necessidades da economia atual.

Um dos grandes trunfos da Pepsi para tomar mercado da Coca Cola na década de 1980 foi justamente a escolha de Michael Jackson como garoto propaganda.

Hoje falamos de menos refrigerantes, combate a obesidade e a busca por uma vida mais saudável.

O palpiteiro lamenta a morte de Michael Jackson como lamenta a morte de qualquer ser humano. Inclusive aqueles que nesse momento são esquecidos, como as vítimas mais pobres da gripe suína. Mas não deixa de ser interessante assistir o funeral de Michael Jackson como o prenúncio de uma era que está chegando ao seu fim. Talvez mais tarde, talvez mais cedo, mas quem está em coma mesmo é a indústria da música Pop...

Thursday, May 07, 2009

E a gripe chegou

Nesse exato momento, sabe-se que há pelo menos 4 casos da gripe suína no Brasil. 

Era questão de tempo para que chegasse. O Brasil faz comércio com quase todos os países do mundo. Tem grandes relações de comércio, cultura e turismo com o México. Todos os anos muitos brasileiros utilizam o México como rota para entrada ilegal nos EUA.

E daí? Daí que o ministério da saúde afirma que os 4 casos identificados são de pessoas que foram medicadas, não apresentam riscos de morte ou de transmissão.

Tudo como já foi dito e palpitado por aqui antes. A gripe suína vai revelar muito mais sobre as carências sociais dos países do que propriamente uma doença com cara de juízo final.

Ao contrário de um tipo de Apocalipse, no qual "a doença, a fome e a guerra" assolariam a humanidade, separando os bons dos maus, teremos um epidemia que deixará mais evidente a diferença entre desenvolvimento e subdesenvolvimento. 

Quem tiver acesso a sistemas de saúde eficientes terá mais chance de resistir. Países que negligenciam a saúde de seus povos serão os mais afetados. 

O palpiteiro tem contato com mais de 1.000 pessoas durante todas as semanas em salas de aula. Não vai usar máscara. Mas irá sempre lembrar que o pânico disseminado pela imprensa é inútil, e lucrativo, para alguns. 

Pessoas com medo não saem de casa. Assistem mais TV e ficam mais tempo na internet. Pessoas com medo não conversam com vizinhos, não ficam na calçada e buscam a segurança do isolamento. Pessoas com medo ficam mais suscetíveis às propagandas. E consomem mais. 

O medo faz mal ao ser humano. E dá uma boa grana para quem souber explorá-lo... 

Wednesday, February 25, 2009

Jerry Lewis

Para quem gostava de ver Jerry Lewis na sessão da tarde e que se lembrou dele após uma constrangedora homenagem do Oscar:

Saturday, February 21, 2009

Carnaval

Alguém poderia dizer que o Carnaval morreu em SP. Sem brincadeiras nas ruas, sem as antigas seringas com água, sem fantasias, sem música.
Alguém poderia dizer que SP ficou tão desumana e sem-graça, que é comprrensível que tanta gente procure sair da cidade sempre que possível. Feriado de Carnaval, por exemplo.
Mas o palpiteiro acredita que enquanto existirem amigos em reunião para churrasco, cerveja e conversas sobre bobagens, o Carnaval resistirá.
Se ainda há alguém ouvindo um samba antigo, uma marcha de matiné, ou ainda querendo entender a razão de toda escola de samba possuir uma ala das baianas, é sinal de que o Carnaval não morreu.
O Carnaval é uma festa que só existe com pessoas querendo ser felizes. Ao menos por alguns dias. Enquanto existirem essas pessoas, existirá o Carnaval.
Bom Carnaval a todos.

Wednesday, February 04, 2009

Alguns Clubes de São Paulo

"Com 10 mil sócios titulares e contribuintes, que levam mais 15 mil dependentes, o clube é freqüentado diariamente por 3.700 pessoas, que usufruem de 39 modalidades esportivas. Para se associar, é preciso indicação de um grupo de membros veteranos e pagar adesão de R$ 160 mil, além da taxa de manutenção mensal de R$ 400." Folha on-line, 18/11/2008.
"2º Edital 2008 - venda de 80 títulos por Edital em Dezembro
Inscrições de 8 a 13 de dezembroAssinatura dos contratos de 17 a 27 de dezembroValor do título R$6.000,00Taxas de transferência iguais às exercidas na Central de AtendimentoDemais condições e procedimentos..." Sítio do Esporte Clube Pinheiros, datado de 24/11/2008
"Para candidatar-se a sócio, é necessário ser apresentado (a) por dois sócios titulares, com pelo menos dois anos no quadro social e que não sejam membros da Diretoria ou Comissões que analisam os processos de admissão;
- O trâmite para aprovação da proposta da admissão leva em média 45 dias, sendo inicialmente afixada sua proposta por 30 dias na entrada do clube para conhecimento dos associados."
Sítio do Clube Paineiras, Morumbi
"A partir da décima doação voluntária de sangue, a Fundação Pró-sangue lhe dará o honrado lugar no Clube Irmãos de Sangue. Basta atender a todos os requisitos. Não precisa pagar nada. Você doa sangue e ainda toma um lanchinho com direito a suco" Relato do palpiteiro, após a sexta doação. Duas foram vinculadas a pacientes que precisaram de sangue. 4 foram voluntárias. Faltam apenas 6 para o palpiteiro entrar no Clube dos Irmãos de Sangue.
Clubes fechados nunca despertaram ambições no palpiteiro.
Para saber mais:

Friday, January 23, 2009

A Rota dos Ratos (Ratlines)

Em tempos de acusação de anti-semitismo para aqueles que criticam atualmente as atitudes militares de Israel, não custa lembrar de uma historinha para lá de interessante.
A Rota dos Ratos ou Ratlines foi o nome dado ao esquema internacional que permitiu a fuga de milhares de nazistas acusados de crimes contra a humanidade. Não se sabe ao certo quantos nazistas delas se aproveitaram, mas o mais importante é saber que existiu e que ainda sabemos muito pouco dos detalhes que envergonhariam muitas pessoas e instituições.
Após a rendição alemã, os aliados (EUA, França, Reino Unido e URSS) decidiram julgar aqueles que colaboraram com os abusos que resultaram na morte de milhões de pessoas. Mesmo antes desse fato muitos nazistas sabiam que seriam julgados e condenados. Antes mesmo da rendição alemã, muitos já haviam fugido. "Os ratos são os primeiros a abandonar o navio", ensina o ditado que acabou por dar nome ao esquema de fuga.
Em primeiro lugar teriam melhores condições de fuga aqueles que possuíssem recursos valiosos para serem negociados. Diamantes e ouro, por exemplo, tomados dos judeus e demais povos oprimidos pela Alemanha Nazista. Assim, os maiores usuários da Rota dos Ratos foram oficiais de maior patente, justamente os que tiveram maior acesso a bens e formas de corrupção durante a guerra. Não por acaso, alguns dos maiores criminosos e assassinos.
O primeiro passo era se desfazer de documentos e demais formas de identificação. Coronéis e Capitães se fizeram passar por soldados rasos. Em seguida arrumaram algum jeito de chegar até a Itália. Os meios foram variados e sempre clandestinos. Trens e caminhões de carga. Os mais bem relacionados já saíam com documentos falsos, mas foram raros.
Na rede de relações desses criminosos aparecia a Máfia italiana. Perseguidos pelos fascistas de Mussolini, muitos mafiosos colaboraram com a CIA, facilitando a entrada das tropas americanas no Sul da Itália. O fato de Michael Corleone ser um soldado americano em O Poderoso Chefão I não é mera coincidência...
Mas além da Máfia, muitos nazistas tiveram uma ajuda acima de suspeitas: padres e bispos católicos. O Bispo Católico Alois Hudal foi o mais conhecidos desses.
O esquema era relativamente simples. O Bispo emitia um documento com um nome falso para o fugitivo. Não chegava a ser um passaporte, mas era um documento reconhecido pela Cruz Vermelha. O fugitivo com nome falso pedia através da Cruz Vermelha um visto de entrada para algum país fora da Europa, em especial a América do Sul. Teoricamente a Cruz Vermelha deveria conferir a veracidade das informações, mas o respeito pela Igreja Católica servia como atestado.
Muitos nazistas vieram para a Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai. Na região havia muitas comunidades com descendentes de alemães que os abrigavam. Ofereciam ajuda por dinheiro, solidariedade diante de um alemão que pouco sabiam de seus atos ou ainda mesmo por convicção. Simpatia pelo nazismo também.
Em São Paulo, grandes criminosos nazistas desembarcaram usando a rota dos Ratos. Josef Mengele chegou a Argentina primeiro, com proteção do governo peronista. Procurado, ficou algum tempo no Paraguai, sob a omissão da ditadura de Stroessner. Perseguido, entrou no Brasil. Viveu um bom tempo no município de Caieiras, próxima a duas grandes indústrias Melhoramentos e Voith, com muitos funcionários alemães. Ao que parece, Mengele teve a generosidade de alemães simpáticos ao Nazismo em SP.
Franz Stangl foi responsável pela morte de 900.000 pessoas no campo de Treblinka, na Polônia. Trabalhou como supervisor de fábrica na VolksWagen até 1967. Foi descoberto e extraditado para a Alemanha, onde morreu após ser julgado e preso.
Gustav Franz Wagner viveu em Atibaia, interior de SP e, assim como Franz Stangl, usava seu nome verdadeiro. Chegou a ser descoberto e denunciado internacionalmente. Mas não foi extraditado. Acabou se matando algum tempo depois.
Com a morte desses nazistas, muitos dos segredos da Rota dos Ratos foram enterrados.
Mas até que ponto autoridades brasileiras da época coloboraram?
As autoridades brasileiras foram omissas por incompetência ou simpatia?
Quando o Vaticano vai abrir seus arquivos e reconhecer que alguns de seus sacerdotes ajudaram Nazistas criminosos de guerra?
E os alemães e descendentes que ajudaram esses nazistas no Brasil? Quem será que eles apoiam nas eleições?...

Sunday, December 07, 2008

Palpite sob encomenda: Índia e Paquistão

O país que chamamos de Índia tem mais de 4.000 anos de história e uma diversidade de idiomas e dialetos. Para um brasileiro médio, fica muito difícil compreender um país com tanta história e mais de 1 bilhão de habitantes num território menor do que a Amazônia Legal.
Os indianos em sua grande maioria (80%) seguem o hinduísmo, religião que valoriza um grande número de deuses e que não possui a centralização que o catolicismo tem. Isso quer dizer que ser hindu no sul da Índia não é a mesma no norte, no leste ou no oeste. O hinduísmo, entre muitas de suas particularidades, admite certas práticas humanas como um ato divino, a exemplo do sexo. Livros e ensinamentos a esse respeito não carregam a carga moralista que temos em outras religiões como o judaísmo, cristianismo e islamismo, por exemplo. No caso dessa última, é preciso sempre lembrar que seus seguidores correspondem a 13% da população. Uma minoria percentual que na prática corresponde a mais de 130 milhões de pessoas.
Divergências religiosas não são exclusividade indiana. O palpiteiro sempre lembra que no Brasil ainda tem pessoas que acham normal um jogador de futebol inscrever em sua camiseta que "Deus é Fiel" e que teriam um ataque histérico se lessem algo como "viva o Exu Caveira". Sim, também temos intolerância religiosa.
A diferença é que temos mais de 90% de cristãos que tentam falar uma mesma língua que é o português. E que se misturam em meio a outras minorias relgiosas. Na Índia, é possível nascer, crescer e morrer numa cidade ou bairro de apenas muçulmanos. Numa sociedade em que o hinduísmo aparece no cinema, na TV e, principalmente, na economia. Ser muçulmano na índia também significa ser discriminado no trabalho, na escola e nas ruas. E por isso os muçulmanos lutam por maior liberdade.
Como em outros lugares do mundo existem aqueles que lutam politicamente, dentro das regras de um jogo democrático que muitas vezes se mostra injusto. E existem também aqueles que se cansam de uma luta pacífica, partindo para ataques violentos como os que tivemos recentemente.
Entender ataques terroristas dentro da Índia exige a compreensão dessas diferenças religiosas que muitas vezes também são étnicas. Ou seja, uma população que além de ter outras crenças e valores, mantém outros idiomas.
O fato é que a Índia vive o desafio de resolver pacificamente as diferenças que carregam há séculos e, em alguns casos, milênios.
Mais uma vez temos a religião como um fator de divergência e morte. Matar em nome de um deus parece uma das maiores contradições de uma pessoa que se diga religiosa, mas é o que ainda temos na humanidade.
E por isso, o palpiteiro encerra esse palpite com uma sugestão: Saramago. O prêmio Nobel de literatura escreveu um artigo muito interessante em 19/09/2001, após os ataques de 11 de Setembro em NY. Curiosamente, começa com uma cena indiana. A quem quiser, boa sorte com um palpite do mais alto nível.

Thursday, August 28, 2008

Palpite de encomenda: energia nuclear

O Ricardo pediu um palpite sobre energia nuclear e como o assunto é de grande interesse do palpiteiro, aí vai.
A energia nuclear é cercada de mitos, medos, preconceitos e exageros. Mitos porque para muitos parece a panaceia que resolverá todo o problema de escassez de energia, dado seu grande potencial de uso. Medos, devido aos riscos que acidentes ou atentados podem provocar no caso da explosão de uma usina nuclear. Chernobyl ainda serve como um grande motivo para esse medo. Preconceitos, pois para muita gente é certo que usinas foram feitas para explodirem, assim como tudo o que se relaciona à energia nuclear leva à idéia de morte e tristeza. Exageros, pois é comum a amplificação de todos os sentimentos acima descritos...
O palpiteiro já foi um grande crítico dessa fonte de energia. Principalmente quando tinha 15 anos e ainda via a possibilidade real de uma guerra nuclear entre os EUA e a então URSS. As preocupações que levavam o palpiteiro a se opor ainda existem, mas foram ponderadas com um pouco de conhecimento sobre o assunto.
É verdade que a energia nuclear envolve riscos, problemas com a deposição do lixo atômico e as tentações para o uso maligno das bombas nucleares. Mas também é verdade que a energia gerada por elas podem alimentar hospitais e escolas que salvam vidas e levam conhecimento.
O Brasil teve uma aventura nuclear que custou muito caro. Por medo de físicos "comunistas", o regime militar preferiu torrar dinheiro com a compra de tecnologia dos EUA e da Alemanha. Quando descobriu que esses países queriam era mesmo ganhar dinheiro e não repassar tecnologia de verdade, a física e a engenharia brasileira foram chamadas.
Temos uma situação inusitada. Duas usinas com tecnologias diferentes, Angra I, dos EUA e, Angra II, da Alemanha. E temos um dos processos mais originais de enriquecimento de urânio, desenvolvido por aqui, depois de muito dinheiro público ter ido pelo ralo.
O medo da bomba não se justifica mais no Brasil. Apenas gente mal informada acreditava no débil mental do Enéas, que defendia a produção de bombas atômicas. Nossa Constituição proíbe a produção dessas armas e defende o restrito uso para fins pacíficos. Qualquer presidente teria que ter dois terços dos votos do senado e da câmara para aprovar algo que não parece ser do interesse da maioria dos brasileiros. E fazer a bomba para jogar em quem? E como?
Pelo lado do fornecimento de energia elétrica, a verdade é que o país tem crescido economicamente e aumentado seus índices de urbanização. São milhões de pessoas que adquirem a primeira geladeira ou uma segunda televisão, todos os anos. É normal o consumo aumentar até mais do que o crescimento da economia pode sugerir.
Recentemente o governo anunciou a retomada de Angra III. Decisão delicada. Terminá-la significa aumentar os riscos de acidentes na região e também os problemas com a deposição do lixo nuclear. Não terminá-la significa desperdiçar milhões de dólares com a manutenção de um equipamento caro e que não pode ser vendido. Um país com tantos problemas sociais não tem o direito de jogar tanto dinheiro fora.
O palpiteiro conhece uma pessoa que foi salva com o uso da radioterapia num tratamento contra tumor. A pessoa está ótima hoje. Ela voltou a sorrir, assim como seus familiares e amigos. Mas o palpiteiro também sabe que o Brasil possui muitas formas de obter energia que não seja apenas com o uso de usinas nucleares.
Resumindo, o palpiteiro concorda com a conclusão de Angra III e com investimentos em pesquisas na área, pois entende que o Brasil não deve ficar à margem de um conhecimento tão importante para a humanidade. Não fazer isso é depender eternamente dos outros nesse setor.
Por outro lado, o palpiteiro entende que 3 usinas nucleares já estão de ótimo tamanho. Vamos utilizá-las e zelar para que não causem problemas a ninguém. E que elas possam contribuir para a formação de técnicos, cientistas e gestores que nos ajudem a buscar fontes realmente limpas, seguras e viáveis. Enquanto não chegamos lá, vamos ter que usar mesmo o que temos. Ou o que podemos ter a médio prazo.

Tuesday, August 05, 2008

Um nome para rua

Uma pessoa que quisesse conhecer algo da história de uma sociedade poderia começar prestando a atenção nos nomes dados a alguns lugares ou monumentos. São Paulo, Espírito Santo, Santa Catarina e Trindade são daqueles nomes que logo revelam a presença católica no Brasil. Saber por exemplo que em vários lugares do país existem grandes avenidas com o nome de Getúlio Vargas também nos dá uma idéia da importância que o homem teve por aqui. De outro modo, ver que em São Paulo não se dá destaque a esse presidente, mas que ostenta com destaque a Família Mesquita e uma avenida 9 de Julho, também ensina o quanto Vargas foi negado nesse estado.
A Praça de Maio na Argentina é a grande referência à independância da nação, assim como também NY homenageou Roosevelt, batizando o aeroporto com o seu nome. Nomes de pessoas, datas históricas, nomes de batalhas são escolhidos para que as gerações seguintes saibam da diferença que alguns eventos ou personalidades tiveram na sua história.
Assim, fica fácil de entender que temos em SP homenagens a generais como Castelo Branco, Costa e Silva e até uma ruazinha com o nome do torturador Sérgio Fleury, deixando claro o destaque que essas personalidades tiveram. Saber que a queda da ditadura não removeu seus nomes, é entender que a lembrança de suas existências e "ações" não incomodam a sociedade paulista hoje em dia. Também é sintomático lembrar que não possuímos muita coisa sobre Luís Carlos Prestes, Paulo Freire e Carlos Marighela na cidade, afinal, foram os inimigos do regime e não mereceram homenagens daqueles que reprimiam. Os nomes dos lugares revelam a história tanto quando destacam como quando desprezam algumas personalidades ou fatos.
Ter um aeroporto com o nome do Governador Franco Montoro é reconhecer a importância que aquele da ditadura teve na redemocratização. Saber que Luíza Erundina escolheu o nome "Direitos Humanos" para avenida na zona norte de SP é admitir que não apenas os perseguidores mereceram destaque. Por outro lado, lembrarmos que um viaduto tem o nome de "Luís Eduardo Magalhães" é lembrar que aliados da ditadura que prosseguiram na vida política com a redemocratização conseguiram de algum modo manter a visibilidade do passado. Mudança de palco e de enredo com velhos atores...
Mas algo de estranho vem ocorrendo com os nomes dos lugares, ou logradouros, como preferem a Prefeitura e o Estado de SP. De uns tempos para cá têm surgido nomes de jornalistas. João Saad da Bandeirantes no Ibirapuera. Júlio de Mesquita Neto, do Estadão, na Marginal Tietê. Roberto Marinho na Marginal Pinheiros. Otávio Frias numa ponte horrorosa no Morumbi. Algo tem motivado a troca de militares e políticos por donos de empresas de notícias.
Alguém mais ingênuo ou estúpido poderia dizer que empresas de notícias apenas relatam fatos e que não influenciam no nosso dia-a-dia. Mas quando esquecemos médicos, professores, bombeiros, policiais, operários e passamos e destacar donos de jornais, emissoras de rádio e de televisão, é sinal de que alguns valores estão mudando. Parece que ao contrário de relatar fatos, jornalistas e patrões das notícias passaram a interferir com mais intensidade a política no Brasil.
Em época de eleições municipais, muitos se lembram que alguns vereadores apenas se dedicam a a votarem nomes de ruas e praças. Isso até parece coisa pequena. Mas esmiuçando bem a escolha de alguns nomes, veremos que até o que aparenta inutilidade tem sua razão de ser.

Monday, March 17, 2008

Trânsito: vai piorar para melhorar

Foi preciso que milhares de ingleses morressem de doenças para que Londres tivesse um sistema de esgoto.
Foi preciso que muitos europeus se matassem para que a Europa e, em especial a Alemanha, percebesse a importância dos Direitos Humanos.
Foi preciso que muitos automóveis se chocassem e que muitas pessoas morressem para que nos EUA inventassem leis e regras de trânsito.
Foi preciso que um incêndio de terríveis proporções em São Paulo, o Joelma, acontecesse para que o corpo de bombeiros fosse melhor equipado e que leis municipais se tornassem mais rigorosas quanto à segurança.
Quanto será preciso para que o trânsito de São Paulo piore para que possamos aprender que investir no transporte individual é um suicídio urbano?
Quanta fumaça tóxica deveremos aspirar até descobrirmos que o culto ao automóvel é algo que nos tem feito mal?
Quanto tempo ainda ficaremos parados no trânsito até percebermos que soluções superficiais como vistoria nos automóveis e pedágios urbanos mascaram o problema, sem alterar o problema maior: o grande número de carros?
Quantos túneis e pontes construiremos até aprendermos que quanto mais se investe na fluidez do trânsito, mais carros serão vendidos, por pura falta de alternativa de transporte coletivo dos cidadãos?
Quantos prédios e shopings serão construídos em áreas inadequadas, com ruas estreitas e já saturadas, até descobrirmos que as construções precisam ser planejadas, fiscalizadas e orientadas?
Quanto tempo ainda levará para descobrirmos que uma cidade administrada para o ganho de poucos irá prejudicar a vida diária de muitos?
Quanto tempo?
Boa notícia: a piora das condições levará indubitavelmente à busca por melhorias sérias e mais justas para todos.
Má notícia: ainda não piorou o bastante...

Wednesday, February 20, 2008

Fidel Castro

Talvez tenha sido em 1989 ou 1988. Mas tenho certeza que o governador de São Paulo era Orestes Quércia. Estava no metrô Barra Funda e vi uma movimentação anormal no Memorial da América Latina. Não muitas pessoas. Além de palpiteiro, sou curioso. Fui conferir e vi: Quércia a Fidel Castro juntos. O governador é alto, mas Fidel parecia um gigante perto dele. Ainda usava o uniforme militar de comandante. A surpresa de ver Fidel a tão poucos metros foi grande. Passando o quase susto, apenas uma certeza, tinha visto um pedaço da história do século XX passar na minha frente.
Costumo dizer que é possivel escrever um livro dizendo apenas coisas boas de Cuba. E outro apenas com as coisas ruins. Geralmente as pessoas escolhem apenas um desses caminhos ao opinarem sobre Cuba, e isso não chega a ser ruim.
Aprendi que discutir Cuba revela muito mais sobre quem argumenta do que esclarece sobre a ilha. Quando preferimos falar bem ou mal de Cuba, não mudamos muita coisa do que acontece por lá. Apenas revelamos o que achamos ser o certo ou o errado num país ou numa sociedade.
Fidel Castro é um pedaço da história do século XX. Um pedaço da história em que escolhíamos entre duas possibilidades, capitalismo ou socialismo. Não havia terceira opção. Neste dilema, uma pergunta simplificadora: a economia deve servir à sociedade, ou a sociedade deve servir à economia?
Este dilema ainda está presente. Ainda não foi superado, pois não foi resolvido.
Estou aguardando o desenrolar dessa história cubana que começou na década de 1950 e que está muito longe de acabar. No mais, vou me divertindo com essa patética imprensa brasileira. é curioso ver aqueles que têm cautela e se referem a Fidel como "líder cubano". Outros são mais descarados e dizem: "ditador cubano". A Folha de São Paulo e a Band News FM adoram essa forma julgadora.
Fidel renunciou ontem e já não é mais o presidente de Cuba. O que irá acontecer ninguém sabe, nem ele.
Sabemos que há abutres rondando Cuba. Representantes de empresas francesas, espanholas, italianas, portuguesas, canadenses, mexicanas e brasileiras estão por lá. Há um país inteiro para se reconstruir. Pelo lado brasileiro dizem que Zé Dirceu tem feito ótimos contatos, favorecendo empresas brasileiras. Reparem que agora esqueceram do Zé. Já não é mais o homem do mensalão. Trata-se do agente político entre empresas e governo brasileiro e o governo cubano.
Mas então o que é Cuba? Prefiro reponder com uma repetitiva piada:
"Um provocador anti-comunista pergunta a Fidel: fui a seu país e vi que apesar das melhorias e avanços que você diz ter alcançado, engenheiras químicas se prostituíam por 30 dólares. Que país é esse, onde engenheiras têm que se prostituir?
Fidel então respondeu: é um país tão avançado que até as prostitutas têm nível superior..."
Adoro essa piada. Revela bem isso: de que lado você está quando pensa ou fala sobre Cuba?

Friday, January 25, 2008

São Luís do Paraitinga

Há um município em São Paulo chamado São Luís do Paraitinga. Está encravado no que um de seus cidadãos, Aziz Nacib Ab´Saber, costuma chamar de "mares de morros". Além de Aziz Ab'Saber, a cidade teve também outro filho ilustre, Oswaldo Cruz, nome dado à rodovia que liga Taubaté a Ubatuba e que serve de acesso à cidade de São Luís do Paraitinga. São Luís é uma das muitas cidades do Vale do rio Paraíba do Sul que prosperaram durante o ciclo do café na região, mas que perderam a força econômica com o esgotamento de seus solos e a descoberta de solos mais férteis no interior de SP. Andando pelas ruas dessas cidades e pelas suas áreas rurais ainda se pode ver construções antigas, muitas delas abandonadas ou tansformadas em hotéis e pousadas. Esgotados os solos, hoje a paisagem rural da região tem gado leiteiro e muito eucalipto para a produção de celulose e carvão para churrasco. São Luís e outros municípios da reigião foram vítimas do uso inadequado dos solos, numa época em que pouca gente ligava para isso e o que interessava era o ganho sem preocupação. Explorar o máximo da terra sem nada devolver. Parece que pouco mudou desde então...

O palpiteiro gosta de São Luís do Paraitinga e de imaginar que num lugar tão afastado de SP nasceu gente como Oswaldo Cruz e Ab'Saber, provando que a genialidade pode surgir nos mais diversos lugares e épocas. De vez em quando o palpiteiro almoça em São Luís. Na última vez em que isso aconteceu ocorreu um caso inusitado.

Andando pelas ruas da cidade, em 18 de janeiro o que se podia ver era um exército de pessoas trabalhando para decoração de carnaval. Em São Luís ainda há carnaval de rua com marchinhas e gente fantasiada. Não pode tocar música de outros lugares, tipo Axé. Há um concurso de marchinas de carnaval, assim como um grande número de blocos. Há o bloco do lençol, por exemplo. Basta se enrolar num lençol e sair pelas ruas da cidade cantando um marchinha que foi escolhida semanas antes do carnaval. Naquele dia a cidade se preparava para uma semi-final. Bonecos gigantes podem ser vistos em lojas e casas. Tecidos coloridos e roupas exageradas também, lembrando o carnaval de rua que se brincava no RJ e em SP até décadas não muito distantes. Há um mercado municipal datado de 1924,onde se pode comprar desde um quilo de carne e uma dúzia de ovos até uma viola caipira e sacis de enfeite. O palpiteiro almoçou e foi ver o que estava acontecendo. Quando deu por si, percebeu que havia perdido a chave do carro. Procura pelos bolsos e pelo chão. Tentativa de reconstituição de todo o percurso feito. Perguntas a donos de lojas e outras pessoas para saber "se alguém tinha achado uma chave de carro..."

Meia hora de buscas frustradas. Então uma luz se fez: "será que a chave poderia estar no contato?". Corrida com a imagem na cabeça de um carro com as portas abertas e saqueado... Quando chega ao carro uma cena curiosa. Cerca de cinco moradores da cidade em volta do carro com um cartaz na mão. O palpteiro não foi idiota o suficiente para esquecer a chave no contato. Mas sim para esquecer na fechadura da porta... Um senhora viu e ficou preocupada. Disse que ninguém na cidade roubaria o carro, pois lá não tem dessas coisas. Mas não garantia pelos turistas. Também disse que uma criança poderia levar a chave do carro e por brincadeira perdê-la. A reunião em volta do carro era para saber como achar o imbecil (palpite meu...) que esqueceu a chave na porta do carro. O anúncio foi feito no auto-falante da praça e ninguém apareceu. A mulher então decidiu pela colocação de um cartaz no carro: " senhor propietário, a chave está na rua tal, número 51...". Bastaria ir até lá e dizer que o carro era meu. A mulher esperou por quase 2 horas até ter essa idéia.

O palpiteiro agradeceu como pôde. Queria ter oferecido algum presente ou algo desse tipo, o que foi devidamente inviabiliado diante das circunstâncias. Como querer agradecer materialmente a alguém que se preocupa com o que é do outro? Um obrigado sincero resolveu a questão.

Às vezes somos contaminados pelos pensamentos sobre o que há de pior nas pessoas. Mesmo procurando agir e contar com o que há de melhor, deixamo-nos levar pelo que é mesquinho e ruim. Em meio a tantas notícias e histórias ruins, é preciso lembrar que nem tudo está perdido. E que se é verdade que existem pessoas sem caráter e honestidade, também é verdade que existem outras dignas e honestas. Além de solidárias. As férias não poderiam ter acabado de melhor maneira. Trânsito na volta a SP, motoristas fazendo aberrações, barulho e medo pelas ruas. Mas também a certeza de que há muito mais do que isso. Em São Luís do Paraitinga, em SP e em muitos outros lugares desse país.

Quem puder que vá conhecer a cidade.

Saturday, December 01, 2007

01 de Dezembro e a Aids

A palavra Aids deriva de uma sigla. Síndrome da Imudeficiência Adquirida. Em protuguês seria Sida, como é referida em Portugal. Um vírus identificado como HIV pode ser transmitido de um ser humano para o outro por meio de contato com sangue ou esperma infectados. Relações sexuais sem o uso de preservativo e o uso de seringas contaminadas são as formas mais comuns de contágio, embora não as únicas.
A AIDS é originária da África, de onde se acredita que tenha passado de macacos para o homem. Muitos africanos morreram de Aids. Em meio a tantas mortes em países afetados por guerras, doenças como tuberculose, e também pela subnutrição, a Aids foi se disseminando lentamente nas áreas rurais. Por volta da década de 1960, muitos países africanos tiveram êxodo rural, facilitando a dispersão da doença. No contato com pessoas de outros países, a Aids finalmente chegou à Europa, EUA, Ásia e Brasil. Deixou de ser endêmica para se tornar epidêmica. Nos EUA morreram muitas pessoas infectadas por ela. Diferente da África, sistemas de saúde que atendiam mais pessoas favoreceram a identificação do problema em 1983, na controversa disputa entre franceses e estadunidenses.
Desde o início a Aids foi cercada de preconceitos. Pela disseminação inicial ser maior entre homossexuais, ganhou o criativo nome de "peste gay". Mais uma vez o preconceito agiu contra a humanidade. Muitas pessoas foram contaminadas acreditando na exclusividade de um doença que atingia "apenas" homossexuais. A Aids afetou pessoas de diferentes classes sociais. Rock Hudson, ator dos EUA, morreu com Aids na década de 1980, e seu caso chocou muita gente. Mais tarde, Fred Mercuri, vocalista do Quem. Lentamente as pessoas foram percebendo que a Aids podia pegar qualquer um. No Brasil também "celebridades" morreram de Aids, assim como os casos mais famosos de Henfil e Cazuza.
Henfil era um cartunista que teve uma atuação forte contra a ditadura. Era hemofílico e se contaminou numa das várias transfusões de sangue que fez. Cazuza era cantor de música pop. Quando doente, decidiu tornar público o seu problema. Deu uma entrevista numa revista chamada "veja" (sempre escreverei com minúsculas...). O objetivo do cidadão era o de alertar as pessoas quanto os riscos de contaminação. Cazuza era péssimo cantor. Mas teve uma grandeza ímpar ao final de sua vida. A tal revista não entendeu a proposta. Ao invés de agir como meio de informação preferiu o sensacionalismo barato. Manchete: "Cazuza agoniza em praça pública". Exemplo de mau jornalismo. Mais uma vez... Ao invés de tratar da doença buscou reforçar a homosexualidade do cantor. Bola fora. Muita gente se indignou. A revistinha seguiu a imprensa marrom. Claro, muita gente se esqueceu disso e voltou a ler o bagulho... O Palpiteiro nunca se esquecerá disso.
Apesar dessas reações preconceituosas, a informação foi se propogando. No início de dos anos 1990, o astro do Basquete dos EUA, Magic Johnson, assumiu ter Aids. Era casado e heterossexual. Também teve a grandeza de usar sua fama para informar as pessoas comuns.
As pesquisas avançaram. Um tratamento à base de muitos remédios combinados permitiram prolongar a vida dos infectados pela doença. O palpiteiro tem um colega de escola que faz esse tratamento. Os remédios são caros, mas distribuídos pelo SUS. Muitas reações adversas ocorrem. Dores de cabeça, por exemplo. O tratamento exige disciplina. Esquecer a hora de tomá-los ou não tê-los na hora certa é perigoso. O sistema imunológico enfraquece e qualquer doença pode ser implacável. Uma gripe pode matar nos casos mais graves. Muito comuns são as mortes por tuberculose.
Os preconceitos foram diminuindo, mas a ignorância tem sido a principal causa de muitos novos casos. Tem gente que acredita que se for contaminada poderia viver com o tal "coquetel" de remédios. Pensam que são aspirinas, desconhecendo as dificuldades para sua obtenção e uso. Outras ainda apostam que a Aids é "doença de gay". A Aids tem sido cada vez mais uma doença associada à pobreza, justamente pela falta de acesso à informação. Existem pessoas que acreditam que o sexo sem camisinha com alguém de pele branca e de classe média não oferece riscos. Mais ou menos como os motoristas que dirigem embriagados. Sabem dirigir mas minimizam os riscos de bater no poste. São Paulo está cheia de postes quebrados por isso. E com muitos caos de Aids também.
No Brasil 0,7% da população tem Aids, segundo o IBGE. Aproximadamente 1.300.000 casos. Camisinhas são distribuídas gratuitamente. Muitas escolas tem a Aids no programa de ensino. Professores esclarecem. Nos meios de informação, às vezes, o assunto é abordado. Menos do que deveria, mas muito mais do que foi no passado. Muita coisa precisa ser feita ainda para se evitar novos caos.
Todas as pessoas com informação sobre Aids tem a obrigação de esclarecer aqueles que não a tem. E toda pessoa responsável tem o dever de aconselhar aqueles que mesmo com informação se arriscam. Um professor do palpiteiro na universidade disse que perdeu uma pessoa muito querida por causa da Aids. Disse que prometeu a si mesmo que sempre abordaria o asusnto quando pudesse. Assumiu esse compromisso pessoal. Era um cara muito arrogante, daqueles que dão asia em frasco de sal de frutas... Mas disse com lágrimas nos olhos. Todos na sala de aula se calaram. Desde então o palpiteiro aderiu ao compromisso do tal professor. O senso de humanidade nesse caso supera qualquer tipo de preconceito e arrogância. Viva o 01 de Dezembro.

Tuesday, September 11, 2007

11 de setembro de 2001

Primeiro Ato: Um garoto (Leonardo) usava headphones na aula. O professor pediu para que ele tirasse os fones de ouvido. O aluno respondeu: "Professor, não é música... Estou ouvindo a notícia. Quatro aviões foram seqüestrados nos EUA... Dois derrubaram o World Trade Center, um atacou o Pentágono e o quarto tá indo pra Casa Branca..."
O professor, arrogantemente respondeu: "Tá bom menino, deixa de conversinha e presta atenção na aula..."

O palpiteiro depois pediu desculpas para o aluno...

Segundo Ato: Tentando desvendar pelo confuso noticiário o que havia ocorrido naquele dia. Um respeitado professor de geopolítica disse que se tratava de um ataque palestino... As informações eram desencontradas. O quarto avião foi derrubado por um caça da Força Aérea dos EUA. Alguns meios de informação chegaram a divulgar isso.
Depois diesseram que os passageiros "heroicamente" lutaram contra os seqüetradores, até que o avião caiu.
Estranho: ficaria feio dizer que um avião militar dos EUA derrubaram um avião cheio de civis para proteger um prédio, a Casa Branca. Afinal, assasinos são os "muçulmanos". Dizer que houve resistência dos passageiros é uma versão muito mais patriótica e atraente em tempos de pré-guerra. O filme "Vôo 93" é uma obra-prima para essa versão cinematográfica.

O palpiteiro acredita tanto nessa versão quanto nos relatórios da CIA que diziam que o Iraque detinha "armas de destruição em massa"...


Terceiro Ato: O turismo teve uma pequena queda em Nova Iorque, após os atentados às torres gêmeas. Depois vieram ataques em Madri e Londres, também cidades que tiveram o movimento turístico afetado. Também a Indonésia sofreu um ataque feroz, em Bali. Para não ficar apenas nisso, a Ásia sofreu com a Tsunami também...
Calculando uma perda modesta de 2% no número de turistas que deixaram de visitar esses lugares, é de se perguntar: para onde foram? Alguns forampara o Nordeste Brasileiro... A região nunca recebeu tantos turistas estrangeiros como nos últimos anos...

E NY? Quem arrisca visitar a cidade em Setembro? É preciso fazer algo. E algo vem sendo feito. Exposições e peças teatrais grandiosas cumprem a tarefa de dizer que tudo está bem e seguro. Não apenas dizer, mas demonstrar.
Uma grande emissora de Tv do Brasil (Brazil) organiza um show em NY, provavelmente com o apoio da prefietura local: "Brazilian Day"... Cria-se assim uma nova atração para a cidade cosmopolita .
Poderia ser em qualquer cidade dos EUA. Boston, Miami, Orlando ou Los Angeles. Mas tinha que ser em NY. EM setembro...
Coincidência ou não, o palpiteiro preferiu dormir. Não aprecia shows promocionais para catálogos de turismo. Também não aprecia nem um pouco a Ivete Sangalo. Quieta, é um espetáculo...

Sunday, August 19, 2007

Milton Santos: é preciso ousar

Em 1993 o palpiteiro ingressou na Universidade de São Paulo para cursar geografia. Como todo calouro, lia tudo o que aparecia na frente, desde avisos no mural até as instruções do extintor de incêndio. Matrícula feita e o rosto sujo de guache, conseguiu ler uma frase pintada no chão: é preciso ousar. Poucas palavras e muita profundiade.

Desde o início das aulas ouvia-se um nome que se fazia acompanhar com tom e postura de respeito: Milton Santos. Com o tempo, descobriu de quem se tratava. Baiano de Brotas de Macaúbas, Milton Santos era um senhor que sempre andava de terno e gravata, sorridente e com uma elegância que poucos conseguem apresentar espontaneamente.

Milton de Almeida Santos concluiu seu doutorado em Strasbourg, na França, em 1958. Em 1964 teve que sair do Brasil. Não servia para dar aula no país que os militares prometiam melhorar. Mas serviu para dar aula na França. Também em Toronto. Serviu também para o MIT. Atuou na África, trabalhando na Tanzânia. Prestou serviços para a Organização Internacioanal do Trabalho, OIT. O mundo respeitava Milton Santos. Menos os chefetes políticos do seu país. Um armênio, Armen Mamigonian, e um árabe, Aziz Ab Saber, o convenceram a dar aula no Brasil, na USP. E finalmente o Brasil recebeu definitivamente o grande mestre.

Na França havia estudado três cidades: Salvador, São Paulo e Paris. Das comparações que fez, tirou conclusões que podem ajudar a interpretar o mundo, rico ou pobre. Era fascinado pela eficiência do correio brasileiro. Muito rígido, impunha horas de estudo rigoroso a quem quisesse acompanhá-lo. O palpiteiro conhece um desses herdeiros do Milton Santos e garante que quem com ele conviveu teve que ter disciplina nos estudos.

O mestre era otimista. Acreditava que as mudanças que tornariam a vida melhor viiram maius cedo ou mais tarde. Apostava na resistência dos mais fracos e debochava da miopia social da classe média. O palpiteiro já escreveu algo sobre isso em 27/12/06. Ao rever o palpite passado se assustou quando percebeu que escreveu em letras maiúsculas: "A MUDANÇA PELA ESCASSEZ". Milton Santos estava mais presente do que ele imaginava.

Hoje há um documentário em cartaz sobre ele chamado: "Encontro com Milton Santos ou o mundo Global visto pelo lado de cá". Coisa boa. Fernanda Montenegro, Osmar Prado e outros como Caetano Veloso não dariam seus nomes a persongem que não merecesse. O filme é bom e útil para quem quiser pensar. Pode emocionar. Mas pode dar sono a quem não tiver um grama de solidariedade.

Alguém disse certa vez que "apenas os gênios vêem o óbvio". Milton Santos leu, estudou, viajou, pensou, debateu, brigou, deu entrevistas e se calou por momentos para chegar a uma simples conclusão: "um outro mundo é possível". Sim, tratava-se de um gênio que sabia que num mundo pautado pela mediocirdade era preciso ousar. Ousar em sonhar. Ousar em ter esperança.

Saturday, July 07, 2007

À espera de Harry Potter

Há alguns anos esse palpiteiro ouviu falar de um tal Harry Potter, um fenômeno da literatura infanto-juvenil. Foi num verão, numa praia, que o palpiteiro viu quatro crianças brigando para dividir o tempo de leitura do livro. Haviam combinado que cada um teria 20 minutos de leitura, pois tinham apenas um livro. Praia linda, limpa, uma casa com piscina e crianças brigando por leitura... O palpiteiro teve que reconhecer que a autora do livro tinha mesmo poderes mágicos. Respeito é bom e todos nós o apreciamos.
Estamos a poucos dias da estréia do mais recente filme de Harry Potter. Produzido pela Warner, o filme é garantia de sucesso de bilheterias. Espaços comprados em Tele-jornais e revistas de grande circulação garantem uma sensação coletiva de ansiedade, necessária a venda de ingressos...
Mas há algo muito maior em Harry Potter do que apenas um sucesso comercial. A história é boa e a autora dos livros digna de respeito. J.K. Rowling deu aula de inglês na cidade do Porto em Portugal. Sabe ler em português e trabalhou na Anistia Internacional. Dizem que teve uma briga feia com seu marido português que a agrediu e a expulsou de casa. Rowling voltou para o Reino Unido onde se dedicou a escrever a história do jovem bruxo.

Saber um pouco da trajetória da autora nos dá a possibilidade de aprendermos mais sobre Harry Potter. Ela apreciava em Portugal ler o Jornal Brasileiro o Pasquim, periódico famoso por seu papel durante a ditadura, com uma linha editorial bem-humorada e crítica, num tempo em que a “grande imprensa” se calava por obrigação da censura ou por conivência com o regime de exceção. Quem assistiu ao filme ou leu o livro sobre o “Cálice de Fogo” viu o incômodo que uma repórter causa a Harry por distorcer as informações que o bruxo dá em entrevistas.

J. K. Rowling sabe provocar sugerindo, sendo militante sem ser panfletária. Na escola dos estudantes de bruxaria há a divisão em casas. Sabe-se que os bruxos do mal têm em comum o fato de serem da casa “Salazar Sonserina”. Identificar a origem do mal com um nome desses é natural para quem viveu em Portugal e soube da ditadura de Salazar. Neste caso, valeu menos a história de Portugal e muito mais um manifesto contra todas formas autoritárias de governo.

Um certo Walldemorth é um bruxo cuja volta aterroriza o mundo dos bruxos. O bruxo do mal defende a idéia da bruxaria praticada somente entre bruxos de “sangue puro”. Um certo Draco Malfoi é um garoto que segue esse pensamento. Malfoi é loiro e debocha dos personagens que são pobres ou de “sangue ruim”, como os amigos de Harry, Ermionne e Ronny. Impossível não associar a idéia de “pureza” de sangue de Malfoi ao discurso nazista de “raça-pura”. Experimente trocar o nome de Walldemorth por Hitler e descubra que o mal é muito mais terreno do que parece no mundo da fantasia.

A história de Harry Potter prende a atenção por ser bem contada. É um anti-herói pobre e modesto. Seus amigos vencem pelo estudo, lealdade e ética. Para J.K. Rowling não é o sangue, a raça, a origem familiar ou a cor da pele que definem uma pessoa, mas sim o seu caráter. A autora soube contar uma história bonita e interessante, em que a mensagem deixada por Mantém Luther King não ficou desagradável. Muitas mensagens podem ainda ser tiradas de um mundo criado por uma escritora que demonstra preocupação ao escrever para crianças e jovens. Conhecer o mundo de Harry Potter é saber que lidar com crianças e adolescentes requer seriedade. Pena os autores de Malhação serem tão atarefados com enredos que visam despertar o consumismo, o sexo, o narcisismo e a superficialidade. Harry Potter também passa mensagens. Não sabemos se por sua origem britânica o faz com classe e elegância. Temos apenas a certeza de que ter compromisso com a ética e mensagens dignas não exige nenhum tipo de bruxaria. Ainda que se recorra a ela como pretexto em romances agradáveis e divertidos.
Muitas crianças e jovens de vários países aguardam a estréia do mais novo filme. Há adultos também. Entre pais, tios e tias, padrinhos e madrinhas estão adultos que admiram boas histórias. Sejam para diversão, sejam para posteriores palpites...

Tuesday, June 05, 2007

Darwin é o cara

O palpiteiro foi conhecer no Masp algo sobre a vida daquele que mudou a forma de entender a vida de todos aqui na Terra: Charles Darwin. Manuscritos, fotos, ilustrações e muitos painéis para informar quem foi o homem. O palpite no dia foi: “Darwin foi O cara...”

Darwin era rico e descendente de uma família que prezava o conhecimento. Gente que o historiador Hobsbawm chamou de “burguesia progressista”. Pessoas de posses que destinavam parte de suas riquezas para o conhecimento. Humboldt na Alemanha, antiga Prússia, foi um desses exemplos, assim como Engels mais tarde. O próprio Santos Dumont foi um exemplo raro de uma família rica brasileira que seguiu parte desse caminho. Eram ricos diferentes, pois queriam algo imaterial, como o reconhecimento por suas idéias e atos. Diferentes de muitos ricos do século XXI que buscam reconhecimento apenas pelo que podem comprar. A Daslu aqui no Brasil é um notório exemplo. Uma repórter de Nova York chegou a escrever que a Daslu era um contraste num país onde a miséria das ruas só não era maior do que a indigência intelectual de suas clientes.
No século XIX, Darwin foi um gênio que até hoje dá o que falar. Sabia que sua teoria incomodaria e gastou décadas para aprimorá-la e então divulgá-la. Havia sido preparado durante a sua juventude para ser pastor e tinha consciência do quanto sua teoria poderia irritar alguns religiosos. Um tal Wallace, mais pobre e não menos genial, aproximou-se bastante da teoria de Darwin. Uma saudável competição motivou Darwin a publicar sua teoria. Ambos se respeitavam e Wallace teve a grandeza para reconhecer a maior consistência dos estudos do seu colega mais velho.
Conhecer essa história nos dá a chance de imaginarmos outras utilidades para o dinheiro. Carros e roupas envelhecem ou saem de moda. Podem morrer como seus donos, antes ou depois. Já disseram que os diamantes são eternos, mas depois de cem anos, ninguém se lembra de quem os lapidou ou os comprou pela primeira vez.

As idéias de Darwin e Wallace foram o grande passo para uma corrida que, iniciada no século XIX, ainda não cessou. Vacinas e antibióticos foram criados, mas precisam constantemente de atualização, pois vírus e bactérias podem também evoluir.

Assim a teoria da evolução das espécies nos possibilita a entender a vida como ela se manifesta: sempre dinâmica. Mais do que a própria teoria, talvez haja a possibilidade de aprendermos com a história de Darwin. Aprendermos e assim educarmos nossos ricos do século XXI, pois há muitas formas de se aproveitar a riqueza, como por exemplo, aprender com a vida.
Nota: A exposição de Darwin está no Masp e me parece que fica até o dia 14 de junho de 2007. Com carteirinha ou carteirada do estudante se paga R$7,00. Mesmo pagando-se o dobro é certeza de economia, pois parte do acervo pertence ao Museu de História Natural da Inglaterra. Ir a Europa para conhecer a história do homem das espécies certamente sairia mais caro...

Tuesday, April 10, 2007

Falando da vida alheia: Florestan Fernandes

Florestan Fernandes nasceu em 22 de julho de 1920. Era filho de uma mulher pobre que ganhava a vida como lavadeira no bairro do Brás, em São Paulo. Apesar da pobreza, Florestan teve um gosto especial para a leitura. Teve que trabalhar desde criança, razão pela qual não pode concluir os seus estudos. Assim, sua história não foi muito diferente das de muitos brasileiros pobres que não puderam terminar seus estudos. Mas Florestan foi um brasileiro diferente.
Quando trabalhava de garçom num restaurante do centro de São Paulo, despertou a curiosidade de alguns estudantes de direito da USP, lá no Largo São Francisco. Um garçom diferente. Educado, Florestan trabalhava com sobriedade. Mas sempre que podia, pegava um livro e se dispunha a ler, aproveitando as horas de menor movimento. Os estudantes se aproximaram de Florestan, tornando-se seus amigos e motivando-o a terminar sues estudos. Florestan Fernandes fez um curso supletivo para terminar o que hoje chamamos de Ensino Médio e, na época, Madureza. Florestan estudou mais e se formou mais tarde em Sociologia. Entrou na USP. Foi colega de curso de um jovem de origem libanesa chamado Aziz Nacib Ab’Saber. (ESSE PALPITEIRO ESCREVE AGORA COM BASE EM TUDO O QUE SE LEMBRA DE UMA PALESTRA DADA PELO PRÓPRIO AZIZ, SENDO QUALQUER IMPRECISÃO FRUTO DE LÁPSOS DE MEMÓRIA...).
Aziz disse certa vez que a amizade com Florestan surgiu naturalmente, diante das circunstâncias. Aziz não era tão pobre, mas era “turco”, tinha dois metros de altura e um inconfundível sotaque do interior de São Paulo. Era tímido. Aziz e Florestan sentavam-se próximos nas aulas do professor francês Roger Bastide. Eram tempos em que a USP tinha professores franceses que davam aulas em francês. Aziz às vezes não entendia alguma passagem da aula do professor Roger e se socorria com o colega. Florestan não se limitava a traduzir a aula. Em francês, aprofundava o que o professor havia dito, chegando ao cúmulo de corrigí-lo algumas vezes. Tudo em voz baixa... Bastide logo percebeu a inteligência do rapaz e o preparou para ser professor da USP. O filho da lavadeira pobre substituiu o professor francês. Devemos essa a Bastide...
Como professor, Florestan percebeu algo de genial num jovem estudante, chamado Fernando Henrique Cardoso. O filho da lavadeira que havia se tornado professor da USP não era preconceituoso e por isso deu grande ajuda para o desenvolvimento do filho do General, ex-aluno do tradicional colégio jesuíta São Luis, de São Paulo.
Mais tarde Fernando Henrique se tornou também professor da USP e, assim como Florestan, cassado após o Ato Institucional número 5, o famigerado AI-5. A história do Fernando Henrique muitos sabem, foi para a França. Curiosamente, poucos falam sobre Florestan. O “comunista” Florestan foi muito bem recebido nos EUA e deu aula na Universidade de Colúmbia. Os EUA podem ser qualquer coisa, menos burros. Viram o tesouro de conhecimento que era Florestan e o aproveitaram. Azar do Brasil, que por ter uma ditadura estúpida o perseguiu. Azar de quem não pode ter aula com ele na USP.

Florestan voltou ao Brasil, mas não à USP. Foi dar aula na PUC. A USP reconheceu mais tarde o valor do professor e o homenageou como “professor emérito”, título que poucos podem ter. A recém-inaugurada biblioteca de Ciências Humanas da USP fez uma exposição sobre Florestan, que dá nome ao novo prédio. Numa das fotos da exposição, uma linda e simbólica foto de Florestan abraçando o amigo Aziz Ab’Saber por ocasião do título de professor emérito.

Florestan se elegeu deputado pelo PT em 1986. O mesmo Florestan que antes, em 1977 foi dar aula em Yale, Universidade que forma a elite dos EUA. Aquela por onde andaram Bil Clinton e o tal George W. Bush. Florestan não servia para a ditadura, mas serviu para Yale... Como deputado, foi uma das referências para a elaboração da nossa Constituição. Os embates foram fortes e o professor funcionava como uma bússola em meio a tantas leis e projetos.

Mais tarde, Itamar Franco deu uma honraria da República, reconhecendo o valor de Florestan. Florestan apoiou Lula em 1994, mas quem levou a presidência foi seu antigo aluno, agora “FHC”. Para ele, Fernando. Florestan foi implacável nas críticas a Fernando. Fernando, agora FHC, sabia a profundidade e o alcance de cada uma delas. Florestan estava velho e doente do fígado. FHC deixou as divergências políticas de lado. Propôs a Florestan que se tratasse nos EUA. Deixou claro que o professor tinha esse direito, dada a prerrogativa da honraria que Itamar o havia concedido.

Florestan agradeceu e mandou dizer que era apenas um funcionário público como outro qualquer. Sugeriu que Fernando melhorasse a saúde pública brasileira, de modo que qualquer cidadão pudesse dignamente ser tratado no próprio país. Florestan foi operado e morreu. Morreu em agosto de 1995, com a dignidade que poucos no Brasil podem até hoje sustentar. Morreu digno e coerente ao que defendia. O professor Florestan era muito mais do que um garçom diferente: era um brasileiro diferente na suas atitudes e na sua importância. Até hoje pode ser considerado uma bússola...

Friday, March 16, 2007

SÃO PAULO, AS CHUVAS E AS TRÊS GRANDES BOBAGENS

Esse palpiteiro vive no hemisfério sul, ganha a vida dando aulas de Geografia e aprendeu antes de entrar na faculdade que em Dezembro se inicia o verão em São Paulo. Com ele as chuvas.
Para quem não conhece, São Paulo tem como marco inicial de sua formação o que chamamos hoje de Pátio do Colégio, um lugar onde os Jesuítas iniciaram um processo de aculturação e envangelização de índios. Quem for até o local, verá que fica numa área mais elevada do que o Tamanduateí. Além de estratégico para a defesa - afinal nem todos os índios queriam ser evangelizados...-, o lugar estava livre das inundações do verão, quando o tal rio transbordava. Pode-se dizer que esse foi o padrão de formação de São Paulo: áreas mais elevadas, como os topos de morros. Alguém que viesse à São Paulo do início do século XX observaria à noite não uma cidade contínua, mas várias. Cada topo de morro das áreas mais centrais com luzes acesas e vales inteiros ainda com a vegetação original, escuros.
Mas a cidade cresceu e foi se expandindo para as áreas disponíveis. Os vales foram gradativamente ocupados por casas e ruas. Os mais ricos- como reza a tradição - ocuparam os melhores lugares, ou seja, aqueles que não inundavam. Os mais pobres... E esse processo foi rápido: São Paulo tinha cerca de 100 mil habitantes em 1900. Hoje conta com mais de 10,5 milhões. Para compararmos, Londres hoje tem cerca de pouco mais de 7 milhões de habitantes, datando aproximadamente do ano 50 D.C. . Crescemos mais em menos tempo. E com menos dinheiro...
Uma grande característica da cidade de São Paulo foi a prioridade dada ao automóvel. Londres, Paris, Nova Iorque e Buenos Aires já tinham metrô quando os dirigentes de São Paulo optaram pelo carro. O Túnel da 9 de Julho, as grandes avenidas como a 23 de Maio e a Paulista são exemplos dessa tara pelo rodoviarismo.
Mas o exemplo maior dessa forma de crescimento da cidade está nas avenidas Marginais do Tietê e do Pinheiros. Geometricamente uma boa idéia. Duas grandes avenidas expressas, ao estilo das vias americanas, conduzindo os fluxos de automóveis nos sentidos norte-sul e leste-oeste. Para alguns poucos a idéia foi melhor ainda. Bastava construir as marginais bem próximas aos rios. Quanto mais próximas, mais espaços da várzea para serem valorizados e vendidos. Assim, foi um bom negócio comprar um brejo antes da contrução e vender depois um terrenão valorizado. Para isso era preciso apenas saber onde seriam construídas as avenidas, comprar o brejo, vendê-los e dar uma porcentagem do ganho ao político que deu ou vendeu a informação. Tudo isso sem meter a mão diretamente nos cofres públicos, mas fazendo a prefeitura dar lucro. Para poucos.
Faltou apenas combinar com as chuvas. Desde o tempo do Anchieta - o tal padre evangelizador - se sabia que as várzeas inundavam no verão. Ninguém em perfeitas condições de sanidade mental construiria em lugares inundáveis. Sobrava espaço então para o futebol. Campos de futebol às margens dos grandes rios e de seus afluentes. E assim, talvez nenhuma expressão seja tão paulistana quanto a do "futebol de várzea"... Mas nem todos dispunham de sanidade mental. A ganância para a obtenção de ganhos com obras superfaturadas, assim como a prática da especulação imobiliária com brejos loteáveis fizeram essa cidade que se orgulha de ser a maior do país se tornar refém de qualquer chuva mais forte.
A cidade continou crescendo e novas áreas foram ocupadas. Outro fenômeno se deu então. Simultânea à tara que São Paulo desenvolveu pelos automóveis, tivemos a fobia por terra. Toda e qualquer área com "mato" passou a ser cimentada. Esse palpiteiro ainda se lembra de sua infância quando visitava casas com quintais enormes cobertos com um piso de cerâmica bem vermelha. A moda passou e hoje é mais elegante ter pisos de ardósia no quintal, com a churrasqueira no fundo. Terra? Isso é coisa de pobre e "dá muito trabalho". Com tantas áreas cimentadas e com tanta ardósia, a água tem cada vez menos lugares para se infiltrar. Os geógrafos americanos estudaram muito isso e chamam de runoff o escoamento superficial de águas como as das chuvas. Menos terra, maior o runoff. Ou o escoamento superficial.
Bingo!! Conseguimos duas grandes bobagens num só processo: avenidas construídas em várzes de rios que se enchem muito rápido com um fluxo de água que não tem mais tanto espaço para se infiltrar. Enchentes.Mas faltava ainda a terceira grande bobagem. Como descrever tudo isso. Num país com péssima qualidade ensino, a geografia para muitos se limita ao conhecimento das capitais dos países ou para um bom desempenho no "Show do Milhão". Tentar compreender o uso do espaço pela sociedade e como esse tipo de uso pode comprometer nossa qualidade de vida se tornou conversa de chatos. Assim nasceu a terceira bobagam: jornalistas que explicam esses problemas apenas pelas chuvas. Exemplo dessa grande asneira são manchetes do tipo: "chuvas castigam São Paulo". Ou ainda sermões ridículos de jornalistas ignorantes que acreditam seriamente que a culpa pelas enchentes é de "quem joga lixo no chão". Na ignorância do jornalismo paulista reiside a confortável omissão frente aos reais problemas que afetam a cidade durante as chuvas de verão.
Alguns insanos chegam a utilizar o termo "caos urbano". Como se essa monstruosidade que construímos não tivesse nenhuma lógica. A lógica do ganho com a venda de carros, a especulação imobiliária e o superfaturamento na construção de ruas e avenidas nos explica muitos dos nossos problemas. Culpar a natureza pode ser muito mais do que ignorância. Atribuir a "São Pedro" ou a qualquer outra entidade espiritual as causas de nossos problemas não deixa de ser um ato de fuga e ou covardia. E enquanto combinarmos ignorância e covardia seremos bombardeados com essa pérola do jornalismo que se repete todos os verões: "CHUVAS CASTIGAM SÃO PAULO"...

Tuesday, February 06, 2007

Kassab cassou o debate

Quando o palpiteiro ingressou na Universidade em 1993, seguiu um conselho: assistir palestras. Descobriu o debate. Foi na universidade que o palpiteiro descobriu essa prática interessantíssima. Uma ou duas pessoas falam por alguns minutos, às vezes um hora, outras vezes até duas, dependendo da importância dos debatedores. Aí então a gloriosa sessão de perguntas. Ninguém é mais importante que ninguém. Uma pessoa habilidosa pergunta já provocando. O debatedor, se também for habilidoso, responde com ironia redobrada. Bons debatedores sabem agitar a galera. E, claro, a galera quer ver o circo pegar fogo. Vale quase tudo. Ironia, cara feia, emoção, indignação, raiva. Mas uma regra é fundamental: respeitar o direito do interlocutor se manifestar.
Foi assim que o palpiteiro viu um debate entre Mário Covas e Roberto Requião, durante a campanha entre Parlamentarismo e Presidencialismo, em 1993. Também viu Marilena Chauí, numa aula inaugural, debatendo com quem quisesse se manifestar o tema cultura e racismo no Brasil. A mesma Marilena Chauí que debateu a eleição presidencial de 1994 com Eva Blay. A primeira defendendo Lula, a segunda, defendendo Fernando Henrique Cardoso, pois era suplente dele naquele ano. Mais tarde o palpiteiro viu o candidato Lula debatendo com alunos curiosos questões sobre política, ideologia e rumos para o Brasil. Mas nenhum desses debates chamou tanto a atenção do palpiteiro quanto Aziz Ab’Saber e Fábio Konder Comparato. O primeiro, Geógrafo reconhecido internacionalmente, é capaz de arrancar lágrimas e gargalhadas em questão de poucos minutos de fala. Sua capacidade impressiona por adequar a fala ao tipo de público a que se dirige. Aziz é capaz de impressionar tanto professores doutores num auditório da USP, quanto qualquer um que assista a uma passeata da qual ele faça parte. O palpiteiro viu as duas situações... Fábio Konder Comparato faz mais o estilo do comedimento. Tem fala suave e postura acadêmica. Talvez o doutorado em Direito em Paris, tenha-o influenciado nesse sentido. Ab’Saber e Comparato fizeram um debate na Faculdade de Economia da USP certa vez. A mesma onde também estiveram tantos debatedores, como Aldo Rebelo e Delfim Neto. Por razões desconhecidas, o debate com Aziz e Comparato foi mal divulgado. Apareceram cerca de dez pessoas. Entre elas um palpiteiro em formação. Havia dúvida se o debate ocorreria. Os dois debatedores surpreenderam. Ao invés de se despedirem e voltarem tristes para casa pediram permissão para fazer algo diferente: descerem as cadeiras do palco e fazer um debate mais informal. Uma conversa com cerca de 15 pessoas em roda. Foi uma das maiores demonstrações de humildade e respeito que esse palpiteiro testemunhou. Um geógrafo disputado entre França e EUA e o advogado de acusação contra Collor no processo de impeachment conversando com simples estudantes de graduação. A regra foi respeitada. Exposição dos debatedores e perguntas de uma platéia de 13 pessoas. Respeito à regra e às pessoas que quisessem se manifestar. Nada de especial. Apenas uma questão de civilidade.
Anos mais tarde, houve uma discussão acalorada na Faculdade de Humanas da USP. A discussão era sobre o fechamento do acesso ao prédio. A TV Globo cobriu o primeiro dia de discussões. Apresentou uma matéria completamente distorcida no seu jornal SP TV. Muitos ficaram indignados com a atitude da emissora. Dias depois, novas discussões. Uma equipe de reportagem da Globo apareceu. Imediatamente, alguns alunos se manifestaram contra ela gritando “fora satanás”... A equipe da emissora ficou preocupada. Democraticamente a galera colocou em votação a presença da Globo no auditório. Ganhou o não. O palpiteiro comemorou como uma criança idiota uma vitória que foi motivo de vergonha. Regina Sader, professora cassada no período da ditadura, estava ao lado do palpiteiro. Ela não viu a euforia com a qual o palpiteiro comemorou a expulsão da Globo. Apenas olhou e disse: “Que absurdo! Lutamos tanto pela liberdade de expressão e agora não permitimos o trabalho de uma canal de televisão...” O palpiteiro acenou com a cabeça, ao mesmo tempo concordando e se sentindo um lixo anti-democrático pela atitude imbecil. Lembrou-se então da lição dos franceses: “posso não concordar com nenhuma palavra do que você fala, mas defenderei até à morte o direito de dizê-las”. É assim que aprendemos a conviver. Lição essa que vale para todos, palpiteiros ou não.
Vale até para quem se julga acima das pessoas comuns, como esse tal prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab que ontem expulsou aos berros um idoso que se manifestou contra ele. O debate é uma prática humana que vem de tempos muito antigos. Sobreviveu ao fim da Grécia Antiga. Sobreviveu ao Império Romano. Resistiu à repressão religiosa da Idade Média. Venceu tanto a ditadura soviética quanto as ditaduras do Nazismo na Alemanha e do anti-comunismo de Argentina e Brasil. A necessidade e a força do debate resistem ao tempo e às pessoas que a ele se opõem. Kassab haverá de passar. Que fique o debate...

Wednesday, January 31, 2007

27 de Janeiro

Com tanta poluição noticiosa, às vezes somos levados à busca incessante pelo que acabou de acontecer. Ao ficarmos sabendo do fato mais recente já nos preparamos para o seguinte, sem nos darmos conta de que acompanhamos muito apreendendo pouco. Nesse turbilhão de notícias das últimas semanas uma data foi pouco lembrada: 27 de janeiro. Neste dia, em 1945, tropas soviéticas liberaram o campo de Auschwitz.
Tratava-se de um complexo militar-prisional onde pessoas eram presas, submetidas a trabalhos forçados e exterminadas. Era um complexo, pois envolvia tanto a prisão quanto o extermínio e o trabalho escravo. Já houve um tempo em que esse palpiteiro buscava informações sobre as atrocidades praticadas nos campos de concentração do nazismo. Nessa busca, o palpiteiro aprendeu que os judeus assumiram o compromisso de jamais esquecer. Seja pela memória dos que morreram, seja pelo sofrimento daqueles que sobreviveram ou tiveram seus parentes assassinados. Há pelo menos uma década e meia o palpiteiro tem procurado ir além das meras descrições. E a pergunta principal é: por quê?
Uma explicação é a desumanização da pessoa, e aqui devemos a aula a Hanna Arendt. A base das atrocidades praticadas contra a humanidade no século XX foi justamente uma visão na qual a pessoa aparece como massa, nunca como indivíduo. Assim, quando colocados no coletivo, não são assassinadas pessoas, mas grupos. Por exemplo: nessa visão, não foi a Anne Frank e nem a Olga Benário que morreram em campos, mas simplesmente “judias”. Do mesmo modo, não foi alguém em especial que assassinou pessoas, mas sim “os nazistas”. O palpiteiro achou genial essa explicação, pois é humana. Imagine que um idiota qualquer como um pacato covarde, cumpridor de suas obrigações na escola, no trabalho, na igreja ou na família. Imagine esse mesmo idiota vestindo uma camisa de alguma torcida organizada. Seja lá qual for. “O médico e o monstro”. Grande transformação. Coletivamente, o idiota sente-se forte. Imbatível, já não mais atende por si, mas pelo grupo ao qual integra, com grande euforia. Mas a euforia é ainda mais fermentada se envolver ódio. Daí a necessidade de uma torcida adversária. Esse palpiteiro já viu muito desses idiotas na vida. Se alguém quiser comprovar faça uma experiência simples. Aproxime-se do infeliz e demonstre interesse pelo grupo ao qual ele se orgulha em fazer parte. Ficará mais convincente se puder escolher alguém de uma torcida do time pelo qual você mesmo gosta. Seja bom ouvinte. Com tempo, tente separar as histórias banais, das histórias que envolvem as brigas contra pessoas de outras torcidas. Não se assuste se notar um forte brilho nos olhos do idiota-covarde-brigão. Pronto, você não está mais diante de um indivíduo, mas de um fragmento de massa...
O problema será se você achar que todo membro de torcida organizada é por princípio um idiota-covarde-brigão. Daí ele poderá também lhe analisar e você poderá ter uma grande surpresa ao saber como é fácil pensar como massa e classificar os outros como grupo e nunca como pessoas.
Agora imagine essa forma de pensamento num exército. Bandeiras gigantes e marcha sincronizada e, claro, um líder raivoso para agitar toda a galera... Esse palpiteiro descobriu que é muito fácil chamar Hitler de louco e imaginar um país inteiro como a Alemanha se comportar como os ratinhos que seguiram o flautista da história infantil. Houve quem concordasse, quem lucrasse e quem apenas se omitisse diante de tal acontecimento.
Tentar entender como tudo isso aconteceu é não esquecer Auschwitz. Admitir que nossa condição humana nos permite ver o outro e a nós mesmos como parte de grupos e não como indivíduos é não esquecer que Auschwitz pode voltar com outros nomes, em outros lugares. Pode voltar no Iraque, pois não seriam crianças morrendo, mas “insurgentes”; pode ser no sul do Líbano, pois não seriam velhinhos mortos em casas bombardeadas, mas “terroristas”; pode ser no Capão Redondo ou na Brasilândia em São Paulo, onde no lugar de jovens mulatos mortos pela PM teríamos “bandidos”. Lembrar Auschwitz é pensar que não se trata apenas de um lugar, mas sim de uma prática. E reconhecer essa prática é um dos primeiros passos para evitar sua repetição. Jürgen Habermmans disse que “não é estúpido acreditar que existam neonazistas na Alemanha mas que existam APENAS na Alemanha”. Foi pensando nisso que lembramos 27 de janeiro de 1945. o “por quê” de Auschwitz seguramente tem muito mais do que essa explicação. Um dia palpitaremos sobre mais algumas.

Saturday, January 27, 2007

Roubando o Ibirapuera

Espaço público deve ser destinado ao interesse público. Isso é óbvio, mas não nem sempre verdadeiro. Quem assistiu a Copa de 2006 pela televisão entende isso. Um grande evento numa Alemanha cheia de histórias. Tentativas de revoluções, guerras e o nazismo, ensinaram a Alemanha que não se pode ignorar o próprio povo em nome de “interesses maiores”. Por isso aquelas cenas de praças lotadas com grandes telões para todos assistirem os jogos. Bastava arranjar um lugar na praça e se divertir. Dinheiro? Apenas para a cerveja e o salsichão... Os alemães gastaram muito dinheiro público para o evento. Não dava para deixar o povão de fora. Por mais ricos que eles sejam, foi preciso garantir ingressos aos estrangeiros e aos patrocinadores, o que excluiu muitos interessados do país em assistir os jogos. Como incluir o povão na festa? Telões.

Mas São Paulo é diferente. O palpiteiro foi até o Parque do Ibirapuera em 26 de janeiro de 2007. Aniversário de 50 anos do planetário. Mas também teve um troço chamado “São Paulo Fashion Week”. Seja lá o que for isso, foi um evento privado, para grandes empresas e para imprensa, e não para o povão. Estacionamentos reservados aos tais “vips”, pretensas modelos com botas de inverno no verão paulistano com 27 graus de temperatura e...Nada para quem quisesse apenas ir ao parque.
O mais interessante é que o evento é mostrado como se fosse algo grandioso para a cidade. Ninguém discute a importância econômica, os empregos gerados e etc... Mas com tanta grana rolando, não dava para ser num espaço privado, longe de quem quisesse apenas passear num parque público de uma cidade com tão poucas opções de lazer público de qualidade? O palpiteiro questionou uma autoridade municipal que por acaso estava no Planetário para as comemorações do dia 26 de janeiro. O tal Eduardo Jorge disse que o palpiteiro tinha razão. Explicou que era mesmo um absurdo a Fundação Bienal alugar seu espaço para a São Paulo Fashion Week. Acrescentou que além de não pagar nada à população de São Paulo, ainda a Prefeitura de São Paulo arcava com os custos de segurança, organização do trânsito etc... O palpiteiro perguntou se não tinha alternativa para reverter isso. O tal Eduardo Jorge disse que tinha, mas exigia uma licitação na qual a Fundação que controla a Bienal talvez pudesse perder.

O palpiteiro ainda não entendeu qual o problema da Bienal perder o seu espaço. Tendo tamanha importância, seria razoável imaginar que alguém com muita grana pudesse ajudá-la. Enquanto isso não acontece, não há licitação. A Bienal de São Paulo não perde seu espaço e a São Paulo Fashion Week continua com um espaço público de área verde reservado aos seus interesses privados, por um preço baratinho. Como podemos ver, há quem ganhe com tal situação. Quem perde? O cidadão que acredita que parques públicos municipais sejam de fato destinados à população...

Foi nessas circunstâncias que o palpiteiro viu um tal Kassab em frente ao Planetário. Parece que é o prefeito de São Paulo. O palpiteiro não resistiu e disse algumas palavrinhas nada doces ao senhor prefeito. Seus assessores e seguranças olharam feio. O prefeito deu uma risadinha amarela, foi embora e a cidade continuou a perder o parque do Ibirapuera...

Thursday, January 18, 2007

Any e a tragédia espetacular

Todo jornalista em começo de carreira aprende que “notícia é quando um homem morde um cachorro e não o contrário”. Uma criança morta por um cão feroz não teria o mesmo apelo que “homem mata pit bul a dentadas...” Tanto quanto a informação precisa e imparcial - seja lá o que for isso...- é preciso ter o talento para chamar a atenção daqueles a que se destinam as notícias e, assim, vender mais jornais, revistas ou aumentar a audiência do rádio, televisão e Internet. Mudam os meios de informação, mas no geral o objetivo é o mesmo: despertar o interesse pela notícia. Em tempos de férias surge o problema. As pessoas querem se divertir, viajar, namorar mais. Janeiro no Brasil é assim. Não é por outro motivo que o ano para as emissoras de televisão como a Globo começa em abril, início de outono e certamente pós-carnaval. Esse palpiteiro mesmo conseguiu ficar dez dias sem qualquer acesso a veículos de informação, no tradicional esforço de desintoxicação informacional que realiza sempre que possível, geralmente em Janeiro. Assim, ficou sabendo que um buraco engoliu terra de suas bordas e fez desaparecer um micro-ônibus com algumas pessoas dentro, além de outros desafortunados que estavam próximos ao local. Teve o conhecimento disso cinco dias mais tarde. Mas não deu outra: com três dias as coisas já estavam esfriando numa metrópole tão violenta como São Paulo e, uma tragédia como a que tivemos, gradativamente foi sendo incorporada na história e no cotidiano de todos. Porém a imprensa precisa de “notícias”. E junto com a terra movida pelos bombeiros, repórteres escavam fatos. É preciso piorar as coisas para que despertem a atenção de todos. Vale tudo: cenas de corpos cobertos em seu resgate e matérias sobre cadelas talentosas do corpo de bombeiros. Uma delas é chamada de Any, como soubemos nesses dias.
Esse palpiteiro passa com relativa freqüência na região do evento, já foi Office-boy e se formou em geografia numa Universidade banhada pelo rio Pinheiros. Mesmo após tudo o que apurou junto à imprensa, o palpiteiro ainda acredita que é mais perigoso ser roubado no Metrô que já funciona em São Paulo do que novas tragédias na parte em construção da dita linha Amarela. E numa quinta-feira chuvosa, o palpiteiro assistiu o filme “Os monstros estão de volta”, na sessão da tarde. Foi muito mórbida a situação na qual a Globo exibia um filme de comédia com a exaltação a cadáveres e assuntos fúnebres intercalando chamadas ao vivo do buraco, na qual um tal César Tralli tentava dar ar de seriedade e respeito ao andamento do resgate de alguns corpos da tragédia do Metrô. Também está sendo patética a forma pela qual Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo cobrem o evento. Manchetes já priorizam o termo “cratera”. Sim, não foi um buraco de uma obra do Metrô. Mas apenas uma cratera. Termo maroto esse. Preserva a companhia Pública responsável maior pelas obras e também o seu controlador, o Estado de São Paulo. O palpiteiro assume os riscos e questiona palpitando:

1) Um movimento de terras dessa magnitude não ocorre como avalanches de desenhos animados. Embora rápidos, há uma série de indícios que olhos atentos de engenheiros civis sabem identificar: fissuras no asfalto ou nas calçadas, por exemplo. Cá entre nós, se você fosse um engenheiro responsável por uma obra desse tamanho assumiria riscos? Arriscaria sua vida ou a de operários, sob a possibilidade de perder a própria vida ou a de responder processos por mortes de subordinados? Arriscaria perder o emprego por um incidente que chamasse a atenção da sociedade e que o tornasse um desempregado?
2) A segunda dúvida se relaciona à primeira: porque a única vítima entre os que trabalhavam na obra foi a de um caminhoneiro que voltou para pegar seus documentos? Teriam sido os outros avisados? Será que num buracão daquele tamanho não exigia a presença de NENHUM funcionário das empresas envolvidas? Sorte ou prudência de quem sabia que algo ruim poderia ocorrer?

Ao que parece, a imprensa quer fazer o homem morder o cachorro. Talvez a Any. Não nos parece que seja interessante questionar o cotidiano brasileiro de omissão de autoridades ou do poder que empreiteiras têm no país. Isso infelizmente nos indica que novas tragédias poderão ocorrer. E que a depender do nível de informação que a sociedade recebe, ficaremos mais no espetáculo da tragédia do que no combate àqueles que as causam. E coitados dos cachorros...