Saturday, November 26, 2011

Um recado para você que vai prestar a Fuvest

Você se submeterá a uma prova que tem o grau de dificuldade natural de um concurso muito concorrido. E que também tem uma proporcional carga de mitos e lendas.

Você é um dos mais de 146 mil candidatos que assumiram o desafio de concorrer a uma vaga na maior universidade da América Latina.

Muitas coisas acontecem simultaneamente na hora da prova.


Tem muita gente que torce por você. E eu arriscaria dizer que dificilmente alguém irá torcer contra. Claro, haverá os invejosos e os inimigos declarados ou não. Mas cá entre nós, você realmente precisa deles?


Quando você estiver diante da prova haverá 90 questões. O combinado é que você acerte o maior número delas, se quiser passar para a segunda fase. Note que acabei de lhe dizer o óbvio. Você já sabia disso. Mas por que então eu lembrei disso?


Se você leu o que foi escrito até aqui é porque quer saber a opinião de mais um palpiteiro entre tantos que lhe dizem sobre a Fuvest. E esse palpiteiro parte de algumas experiências em relação a ela.

A primeira e mais importante é a de quem já se submeteu a essa prova sem ter a mínima noção do que estava a fazer. E que passou para a segunda fase e não viu o nome na lista dos aprovados em fevereiro. Sim, o palpiteiro já se frustrou com a prova.

A segunda experiência é a de quem já foi aprovado por ela. A de quem já viu o nome na tal lista. E que teve uma alegria tão grande que tornou a frustração anterior apenas o que realmente foi: um motivo para o aprendizado.

A terceira experiência é a de quem acompanha essa prova profissionalmente desde 1996. Enquanto você estiver na prova eu estarei a esperar a divulgação oficial dela. Minha ansiedade não se compara a sua. Mas também é grande, acredite. Durante todos os anos eu me empenho, assim como os meus mais sérios colegas, a tentar preparar pessoas como você, que só querem passar na dita prova. Você não tem ideia da felicidade que um professor sente quando um aluno diz que se lembrou das suas aulas durante a prova. Não há elogio, bajulação ou forma de agrado maior que supere esse sentimento.

A quarta experiência é a de quem já prestou mais de 5 vezes a Fuvest sem ter a mínima obrigação de ser aprovado- e não queira perguntar os motivos disso...A uns 20 minutos antes do início da prova os candidatos já estão dispostos em seus lugares, escolhidos pela Fuvest. Acostume-se a isso, pois nessa prova você não escolhe nem a carteira... Você olhará à sua volta e verá que a maioria dos candidatos tem a sua idade, ou que está muito próximo dela. Haverá um ou outro candidato mais velho. E todos calados. Alguns mais nervosos e outros nem tantos. Alguns fingindo concentração e outros realmente concentrados. Numa dessas provas que prestei sem a obrigação de passar, chamou-me a atenção uma garota de uns 17 anos que falava sozinha. Nem tanto o fato dela ter amigos imaginários, mas sobretudo pelo inusitado. Ninguém achou estranho.


Na hora em que o fiscal autorizar o início da prova muitas coisas passarão na sua cabeça. Qualquer coisa que não seja útil na prova só irá lhe atrapalhar. A tabela periódica, a cachorra Baleia de "Vidas Secas", a Líbia, Napoleão, b2 menos 4 ac, Newton, Azão e azinho, To be... Tudo isso poderá ter alguma utilidade na prova. E muito disso já está na sua cabeça.

Mas um problema maior que pode surgir são os fantasmas que você mesmo poderá criar. Preocupar-se com o número de questões, com a nota de corte e outras bobagens desse tipo na hora da prova é algo que não o ajudará. Não sei se você sabe, mas no momento em que você estiver fazendo a prova, nem a Fuvest saberá a nota de corte. Ela é definida pelo número de acertos dos candidatos. Uma prova mais fácil ou mais difícil pode fazer oscilar muito essa nota. E quem saberá se a prova foi fácil ou não? Ninguém...rs... Somente após os cartões de respostas terem sido lidos é que saberemos se os candidatos acertaram mais ou menos do que aqueles do anos anterior. Qualquer afirmação antes disso é um chute. Tão somente.

Outro fantasma que costuma aparecer é o julgamento pessoal. Ao invés de se concentrar na prova você começa a pensar no que fez ou no que deixou de fazer. Sejamos francos. Nós sempre sabemos o que fizemos de certo ou errado. E em geral estudamos muito menos do que gostamos de admitir publicamente. Se você gastou mais horas no MSN ou no facebook do que estudando ao longo do ano, isso é algo que diz respeito a você. Caso tenha feito isso, deixe essa reflexão para depois. É sempre bom pensar nos próprios atos. MAS FAÇA ISSO DEPOIS DA PROVA!!! Você está num concurso vestibular, não num divã. Não se esqueça disso...

E por fim, o fantasma que mais amedronta é irmão gêmeo do anterior. Se um lhe atrapalha porque você se julga, o outro o massacra porque o faz pensar no que você é perante os outros. Já testemunhei candidatos que reduziram sua frustração quando souberam do fracasso de outros. Já ouvi relatos de gente que ficou 40 minutos diante da prova sem nada fazer. Roendo as unhas e com o pânico de pensar no que os outros diriam diante de um eventual novo fracasso.


Não tenho a fórmula mágica para você passar na prova. E acredite que torço muito por você. Mas tenho a franqueza e a vivência suficientes para lhe afirmar que além da preparação acadêmica você terá que ter maturidade.


Num mundo onde se cultua a eterna juventude, maturidade tem sido uma palavra com pouca popularidade. Nesse caso, o que entendo como maturidade é o poder de misturar a ousadia e a humildade em doses adequadas. Tenha a ousadia para afirmar que não tem medo da Fuvest. Tenha a humildade para reconhecer que é difícil e que há muita gente merecedora.


Por fim vou lhe confessar algo: passar na Fuvest é apenas uma parte. A outra é estudar e seguir na carreira que você escolheu. Ninguém se torna melhor por ter estudado na USP. Você poderá ter as melhores propostas de trabalho e até algum status, mas não é a grife USP que melhora as pessoas. Paulo Maluf estudou na USP e não preciso dizer porque lembrei do nome dele nesse momento... Mas também estudaram pessoas maravilhosas que fizeram a diferença na história recente do Brasil. Conheço um bocado de pessoas que admiro e amo e que são muito felizes sem terem estudado na USP. Conheço pessoas execráveis e dignas de pena e que estudaram lá também.

Seja lá qual for o seu destino estou aqui, torcendo por você. Eu e todas as pessoas que realmente querem o seu bem. Algumas dessas pessoas talvez você nem saiba que existem. Mas elas torcem por você.


Ao fim de tudo, não lhe desejo sorte. Torço para que tenha mais do que inteligência. Torço para que tenha sabedoria.

Guarde isso. Mas não precisa se lembrar disso na prova...


Tuesday, November 15, 2011

Itália, Euro e um projeto de desgraça comunitária

Neste palpite segue em primeiro lugar um mea culpa. O palpiteiro sustentou pelo menos por 10 anos a ideia de que o Euro era um projeto bem-sucedido e fadado ao sucesso. Na arrogância daquele que palpita e não pensa, esse escriba chegou a afirmar, por várias vezes, que o Reino Unido não aderia ao Euro por uma questão de capricho "provinciano". O erro crucial dos eufóricos de 10 anos atrás era foi muito simples. Confundiram possibilidade com fato consumado.

Pois bem, anos se passaram entre a adoção do Euro e a crise de 2008 e, em 2011,discute-se dois pontos fundamentais: até que ponto o Euro foi uma opção bem sucedida e até quando resistirá aos sucessivos eventos que teimam em mostrar que se tratou de um projeto fracassado?

O que aqui se coloca é se o Euro, enquanto símbolo da unidade europeia , resistirá ou não.

Após a crise deflagrada em 2008 nos EUA ficou evidente que os países mais irresponsáveis com as suas irresponsabilidades financeiras teriam forçosamente as maiores perdas.

Grécia, Portugal, Irlanda e Espanha não surpreenderam portanto.

Mas o problema foi estender as incerteza a países como a Itália e a França.


Mencione sem titubear pelo menos 1 um produto grego, português ou espanhol que não seja vinho, azeite ou azeitona em conserva. Pois isso retrata a fragilidade econômica desses países. Vivem de produtos pouco rentáveis e de atividades frágeis como o turismo. Antes da crise turistas dos EUA e do Japão figuravam entre aqueles que sustentavam o comércio. Depois dela há quem duvide da capacidade econômica desses países se sustentarem.

Mas a Itália era diferente. Ou ao menos parecia. Fiat, Ferrari e Pirelli eram alguns dos ícones empresariais do país, para não falar do obscuro lastro financeiro do Vaticano...

Mas descobriram que a Itália não tinha uma economia tão sólida quanto pareciam os anúncios da Benneton. O buraco é muito mais embaixo.

Logo então seguiu a desconfiança mais óbvia. Se a Itália não tem fôlego suficiente para sustentar suas dívidas, o que seria então dos outros países da Zona do Euro?


Aí está o nó. O país pode ser o arremedo de economia moderna como a Grécia ou a potência industrial italiana, mas ninguem nega um fato: os europeus estão todos amarrados. O que chamam de crise grega é nada mais do que o risco de calote de empréstimos concedidos por bancos alemães, franceses, ingleses e americanos. Isto é, um calote europeu representa um tombo muito forte entre bancos dos mais fortes, alemães, ingleses, franceses e italianos em especial.

Daí o medo coletivo. Um calote na Grécia se estenderia a Portugal, Irlanda e Espanha. No auge da desgraça a Itália. O que se vê hoje é menos o risco de presente e muito mais o medo do futuro.

Mas como algumas desgraças não são solteiras, muitos especuladores não titubearam em perguntar: se Portugal não é tão seguro, por que a Itália o seria??

Financistas e larápios das finanças não são burros. Não esperam os caos para se movimentarem. O fogo não os assusta, pois fogem como loucos do mínimo sinal de fumaça.

A Grécia abriga a fogueira. Portugal, Irlanda, Espanha e Itália exalam fumaça...



O lastro econômico do Euro tem endereço: Frankfurt. Não é por acaso que o Banco Central Europeu está naquela cidade. A Alemanha é o principal motor econômico do Euro. Num contexto de crise generalizada a Grécia perdeu 5% por do seu PIB em relação a 201o. A Alemanha ganhou modestos 0,5%. Mas ainda assim ganhou.


Sabe-se lá o que irá acontecer.



Em 10 anos teremos apenas duas possíveis verdades. A primeira, otimista, será a de que a Europa, a despeito das turbulências, foi capaz de resistir e manter o projeto de uma unidade econômica simbolizada pelo Euro. A segunda, pessimista, apontará o Euro como uma ideia muito bem elaborada, mas que fracassou pela incapacidade de plena união daquilo que um dia chamaram de União Europeia.


O tempo será, mais uma vez, o senhor da razão.


Enquanto isso observamos o inusitado. Europeus mendicando dólares do Brasil, Rússia, Ìndia e China para acertar suas contas.


E o mais interessante. A incompetência dos líderes do presente em oferecer um solução comunitária para uma crise que é sobretudo comum.


Os líderes europeus das décadas de 1940, 1950 e 1960 foram sábios o suficiente para perceberem que perderiam muito isolados.


Os líderes europeus do presente parecem presos demais às pressões domésticas para ousarem em soluções transnacionais.


Quem viver verá. E o que se vê hoje, em novembro de 2011, não parece lá grande coisa...