Monday, April 29, 2013

Vanzolini e nossa grande perda

Foi em 1922 que se oficializou o Modernisno no Brasil, mais precisamente no Teatro Municipal de São Paulo. Como qualquer outro movimento cultural e político não é correto acreditar que foi ali, naquele teatro e naqueles dias que o Modernismo tenha começado por aqui. O local e a data são apenas referências de espaço e tempo num mundo carente de maiores abstrações. Para muita gente o Modernismo foi uma das matérias de prova no colégio ou de questão de vestibular.  Foi muito mais que isso.
 
Nossos modernistas de 1922 apenas deram expressão a algo que inquietava muitos no Brasil. Simplificadamente queriam o novo, mas sem perda de identidade. Em outras palavras, ser moderno sim, mas sem deixarmos de sermos brasileiros.
 
O século XX foi fértil em muitas inquietações, por aqui, e pelo mundo. Entre as décadas de 1920 e 1960 muitas coisas aconteceram. Um crise financeira, uma guerra mundial, perseguições e ódio disseminado pelos meios de comunicação. (Triste é constatar que, à execeção de uma guerra mundial, não parecemos ter mudado tanto assim...)Mas não foram só tristezas que esse período vivenciou. Tivemos Picasso, Freud, Einstein e Garrincha. Tivemos Vargas, vivo e morto, Carmem Miranda e Pixinguinha.
 
A Universidade de São Paulo nasceu nessa janela histórica de 1920 a 1960. A universidade que pretendeu, um dia, formular o pensamento e a ciência que serviriam ao país. A USP nasceu pretenciosa e ousada. Numa época em que se pensava grande e para frente. Num período em que se buscava o melhor para nós mesmos. Um tempo em que a USP se diferenciou por querer ser um centro de excelência do pensamento e da crítica. Um tempo distante da indústria de artigos e publicações para a participação em listas de "grandes" universidades. É irônico notar que a USP foi maior quando se preocupava mais em pensar do que parecer que pensava...
 
A rua Maria Antónia, no centro de São Paulo, foi o berço da USP. Por lá passaram alguns do nomes da ciência que mais nos orgulharam no século XX. Mestres que foram além da pesquisa. Brasileiros que pensaram grande, por não terem desprezado o  pequeno.
 
Entre os mestres que tivemos, dois nasceram no mesmo ano, 1924. Um faleceu no ano passado, Aziz Ab Saber. O outro faleceu ontem, Paulo Vanzolini.
 
Aziz contou que em 1942 frequentava muito a então biblioteca Municipal de São Paulo, que fica não muito longe da Maria Antónia. Disse que fazia parte de um grupo de amigos que cultuava a geração de 1922. Estudavam ciência, mas apreciavam literatura, música, poesia e política. O respeito que tinham pelos modernistas era tão grande que partiu deles o pedido para que a Biblioteca tivesse o nome que até hoje conserva: Mario de Andrade.
 
Aziz Ab Saber e Paulo Vanzolini estão entre os produtos do modernismo brasileiro. Como foram Niemeyer, a Petrobrás e a Embraer. Foram modernos, ousados e genuinamente brasileiros. Produziram muitos trabalhos individuais,  e escreveram juntos a Teoria dos Refúgios, referência na produção científica mundial. Mas foram mais do que cientistas. Vanzolini alternou sue trablaho de pesquisador com o de funcionário do Museu de Zoologia da USP. Mais do que cientista, atuou num museu pouco mencionado, mas cuja proposta é engrandecedora. Na cultura Vanzolini se tornou um dos grandes compositores de Samba. Não sabia tocar nenhum instrumento e, segundo ele mesmo, não diferenciava um tom maior de um menor. Mas escrevia a letra, criava a melodia e cantarolava para músicos que davam forma para suas criações. Vanzolini prezava as pessoas simples e autênticas. Conviveu com Adoniran Barbosa, embora não tenha escrito nada com ele, para nosso azar.
 
Aziz Ab Saber era o homem das aulas magnas. O mestre que palestrava para professores aos sábados, interessado em compartilhar o que sabia para aqueles encarregados de educar crianças e jovens. Ab Saber foi um dos maiores exemplos de cientista a serviço do país que tanto amava. Assinou manifestos, participou de reivindicações e brigou com políticos. Sempre com muita energia e disposição.
 
 
Vivemos tempos tão interessantes quanto perigosos. Tempos em que a faciliade de acesso à informação não tem necessariamente resultado em ganhos de conteúdo. Tempos em que a discussão e o debate parecem ofender àqueles com suas verdades cristalizadas. A perda de Vanzolini ontem e de Aziz no ano passado deveria servir para pensarmos melhor no que temos feito com nossas universidades, escolas e país. Que tipo de seres humanos estamos a formar hoje? Sinceramente, que tempos são esses de Felicianos a serem mais lembrados do que Vanzolinis? Quem tempos são esses em que campanhas fascistas alternam aplausos a assassinos do Carandiru com companhas pela redução da maioridade penal?
 
Quem ainda não percebeu que estamos flertando com o perigo do pensamento único, excludente, autoritário e intolerante?
 
A História nos prega peças e o palpiteiro aguarda a mais uma das suas. Pois quando tudo parece fadado ao pior, por vezes podemos ter o melhor. Do século do nazi-fascismo, ditadura civil-militar e Hebe Camargo conseguimos nomes como os de Vazonlini e Ab Saber. Um olhar mais atento à nossa volta poderia nos levar ao desânimo diante da mediocridade reinante. Nossos mestres provaram que é possível sermos maiores em meio a tantas dificuldades e resistências. 
 
Que Vazolini descanse em paz. Nós não.

Saturday, April 06, 2013

Um palpite sobre a crise da Coreia: Drama e comédia no caso da Coreia...

A mobilização militar e a troca de provocações entre as autoridades da Coreia do Norte e dos EUA são amplificadas, disseminadas e dramatizadas pela imprensa. Há fatos. E há a interpretação dramatizada deles. O palpiteiro, enquanto se diverte com a histeria midiática do caso, busca fatos... 

Em 1983, um avião da Korean Air Lines violou o espaço aéreo da então URSS, no extremo leste siberiano. Caças soviéticos foram acionados. Seguindo orientações superiores, um caça derrubou o Boeing, no caso conhecido como KAL007. O avião caiu e não houve sobreviventes. Os números denunciaram a morte de 269 pessoas. 

Esse caso indignou a opinião pública internacional em 1983, época de Guerra Fria, sem internet. As investigações foram prejudicadas pela recusa da Rússia, senhora da URSS, em liberar dados que pudessem esclarecer o que de fato ocorreu. 

Pelo lado dos EUA- o voo tinha partido de Nova Iorque e tinha cidadãos estadunidenses- a URSS cometeu um crime internacional, ao abater um avião civil com 269 inocentes. Pelo lado da URSS, os pilotos de seus caças agiram da forma correta, cumprindo ordens diante de um avião que não foi identificado. Pelo lado dos EUA e da Coreia do Sul, o avião violou o espaço aéreo da URSS por erro nos equipamentos de navegação num tempo em que não existia GPS. Pelo lado da URSS, qualquer país invadido no seu espaço aéreo pode abater o avião intrometido. Entre um lado e outro, repousa a verdade e 269 almas...

Esse caso horroroso parece absurdo hoje em dia. Mas fez parte da rotina da Guerra Fria entre 1945 e 1991. As duas superpotências não podiam se enfrentar diretamente, devido às suas capacidades nucleares. Mas se provocavam indiretamente, usando outros países. Quase 3 décadas depois do KAL007, muita gente desconfia do mais sórdido: os EUA, ao enviarem mensagens erradas, usaram o avião da Korean Air Lines para testar o sistema de radares da URSS, na Sibéria. Os radares detectataram o avião e foi derrubado. À parte a tristeza das famílias das vítimas, o que tivemos foi um jogo no qual uma superpotênica provocou e a outra não recuou. E quem se deu mal foram os coitados que perderam suas vidas no KAL007. 

Em pleno século XXI a pergunta "se vamos ter uma guerra nuclear entre EUA e a Coreia do Norte" não é das mais inteligentes. A melhor opção é questionar: por que ainda há 2 Coreias no mundo pós URSS?? Por que elas não se unificaram como a Alemanha?

Em primeiro lugar é preciso lembrar que a divisão de um país milenar foi uma das bizarrices de um período histórico muito bem determinado. Desde então, a Coreia dividida rasgou a história de um povo, mas atendeu aos interesses das elites dos 2 lados. Pelo lado da Coreia do Norte há uma elite de burocratas e militares que não teriam o mesmo poder econômico e a mesma influência social numa Coreia reunificada. Pelo lado da Coreia do Sul não há interesse em ter o poder dividido com os "pobres" da Coreia do Norte. Grande parte do povo coreano gostaria de ver seu país reunificado. As elites políticas e econômicas dos 2 lados não. 

Pelo mundo afora não há interesse na reunificação coreana. A Coreia do Norte é pobre mas possui um exército de respeito. A Coreia do Sul é uma piada militar, mas uma potência econômica. Uma Coreia reunificada- nos moldes da Alemanha pós-Muro de Berlim- formaria uma potência regional de respeito. E esse é um problema, não para os coreanos. Japão, China, Rússia e EUA não têm o menor interesse em aprovar o surgimento de uma potência média num espaço onde disputam cada milímitro de influência política e militar. Não interessa aos outros a unificação coreana. Simples assim.

Mas por que o presidente norte-coreano é tão provocativo? 

Não é estúpido reconhecer que Kim-Jun-un provoca crises externas para saciar a elite militar da Coreia do Norte e a elite burocrática que vive às custas de um Estado voltado para a guerra. Estúpido é acreditar que isso só ocorre por lá. 

O mundo ainda vive uma crise econômica e social das mais graves. As perspectivas não têm sido boas e, uma ameaça de guerra, é muito conveniente para governos sem propostas e credibilidade. Na Coreia do Norte há fome, pobreza e repressão. Uma ameaça de guerra no mínimo distrai os potenciais opositores do governo pelo apelo nacionalista que toda guerra desperta. Assim é nos EUA, Japão e Rússia. Sem ameaças externas, estadunidenses, japoneses, russos e coreanos teriam que ser defrontados com seus problemas domésticos e reais. A falta de emprego, a queda do padrão de vida e os excessivos gastos militares são deixados de lado. Convenientemente. Ou são justificados diante de "um mal maior". No Brasil isso parece estranho. Acostumados a criticar nossos governos, adquirimos uma qualidade pouco reconhecida ente nós. A de que nossos problemas são culpa nossa, não dos outros. NENHUM presidente ou presidenta do Brasil jamais apelou para crises externas para dissimular problemas internos. Pelo menos desde Vargas até Dilma. Nem o doido do Jânio, o histérico do Collor e os fardados da ditadura civil-militar. Isso no mundão afora não é tão comum e óbvio como parece ser por aqui. 

Assim, as provocações de Kim-Jun-un seguem um roteiro bem conhecido. Declarações raivosas, mobilização de tropas e aumento das tensões. Pelo lado dos EUA, Coreia do Sul e Japão, o mesmo. Nesse teatro de farsas convenientes, a guerra não é desejada. TODOS perderiam. O que fazem é exaltar a ameaça, demonstrar os riscos e faturar com o medo coletivo de seus povos. O medo é um poderoso - e perigoso - instrumento de coesão nacional a sustentar governos ineficientes, corruptos e irresponsáveis em seus gastos militares. 

Mas há um risco. O jogo de ameanças de guerra não é para todos. Apenas bons jogadores se beneficiam dele. Sempre há o risco de alguém sair do tom, agir de modo mais agressivo do que o esperado. E avançar além do que o outro lado pode suportar. O segredo da política externa mais agressiva não é ameaçar. Mas dar ao ameaçado alguma chance de saída honrosa. Diante de um impasse no qual um país é confrontado entre a luta e a covardia, o mais comum é o seu líder partir para o ataque. É nesse contexto que as guerras estúpidas ocorrem. E vidas se perdem, Estupidamente. 

Pelo que já leu, ouviu, viu e pensou, o palpiteiro afirma que um conflito entre a Coreia do Norte e os EUA e seus aliados (Japão e Coreia do Sul) é possível, mas pouco provável. A tecnologia nuclear nos trouxe essa macabra segurança. A guerra entre detentores de bombas atômicas não ocorre devido ao apelo da paz. Ela simplesmente não ocorre pelo medo da auto-destruição. Na Guerra Fria chamávamos isso de "equilíbrio pelo terror". 

O palpiteiro arrisca ser desmentido pelos fatos. Aposta que essa tensão militar irá passar. O que não quer dizer que não possamos ter uma guerra daqui a poucos minutos. Mas não há o cheiro da guerra no ar. A "névoa da guerra" ainda não pairou sobre nós. 

Evidências?

O jovem presidente da Coreia do Norte recomendou que os embaixadores de outros países se retirassem de sua capital, por não ter como garantir a segunraça deles em caso de guerra. Isso é um típico aviso público de que as coisas estão esquentadando. Pelo lado da realidade, até este momento em que o palpiteiro escreve, NENHUMA das grandes potências com embaixadores na Coreia do Norte retirou seus representantes do país. De acordo com nota do Itamaraty, o embaixador do Brasil ali permanecerá, até seguna ordem. Cá ente nós, diante de uma ameaça REAL de guerra, alguém acredita que tantos países abandonariam seus embaixadores num alvo de bombas nucleares? Estamos falando de  Alemanha, Gra-Bretanha, Suécia, Polônia, Romênia, República Tcheca e Bulgária, países com embaixadores na Coreia do Norte que não acataram a recomendação de retirada. 

Alguém realmente acredita que os EUA não teriam uma mobilização ousada e grande para retirar os milhares de seus cidadãos da Coreia do Sul e do Japão caso acreditassem mesmo que teriam uma guerra de verdade?

A ameaça de guerra entre a Coreia do Norte e seus rivais, EUA à frente, interessa aos governos dissimulados que precisam disso para suportar as críticas de seus erros em outras áreas, econômicas e sociais em especial. Também interessa a setores da mídia, que carecem das vendas de jornais, revistas e audiência, perdidas com a internet. 

No mundo real, alimentado por informações apuradas e mais próximas da realidade, essa guerra é mais uma das muitas armações que o mundo já viu. Acredita quem quiser. Ou estiver para lá de mal informado...