Saturday, July 07, 2007

À espera de Harry Potter

Há alguns anos esse palpiteiro ouviu falar de um tal Harry Potter, um fenômeno da literatura infanto-juvenil. Foi num verão, numa praia, que o palpiteiro viu quatro crianças brigando para dividir o tempo de leitura do livro. Haviam combinado que cada um teria 20 minutos de leitura, pois tinham apenas um livro. Praia linda, limpa, uma casa com piscina e crianças brigando por leitura... O palpiteiro teve que reconhecer que a autora do livro tinha mesmo poderes mágicos. Respeito é bom e todos nós o apreciamos.
Estamos a poucos dias da estréia do mais recente filme de Harry Potter. Produzido pela Warner, o filme é garantia de sucesso de bilheterias. Espaços comprados em Tele-jornais e revistas de grande circulação garantem uma sensação coletiva de ansiedade, necessária a venda de ingressos...
Mas há algo muito maior em Harry Potter do que apenas um sucesso comercial. A história é boa e a autora dos livros digna de respeito. J.K. Rowling deu aula de inglês na cidade do Porto em Portugal. Sabe ler em português e trabalhou na Anistia Internacional. Dizem que teve uma briga feia com seu marido português que a agrediu e a expulsou de casa. Rowling voltou para o Reino Unido onde se dedicou a escrever a história do jovem bruxo.

Saber um pouco da trajetória da autora nos dá a possibilidade de aprendermos mais sobre Harry Potter. Ela apreciava em Portugal ler o Jornal Brasileiro o Pasquim, periódico famoso por seu papel durante a ditadura, com uma linha editorial bem-humorada e crítica, num tempo em que a “grande imprensa” se calava por obrigação da censura ou por conivência com o regime de exceção. Quem assistiu ao filme ou leu o livro sobre o “Cálice de Fogo” viu o incômodo que uma repórter causa a Harry por distorcer as informações que o bruxo dá em entrevistas.

J. K. Rowling sabe provocar sugerindo, sendo militante sem ser panfletária. Na escola dos estudantes de bruxaria há a divisão em casas. Sabe-se que os bruxos do mal têm em comum o fato de serem da casa “Salazar Sonserina”. Identificar a origem do mal com um nome desses é natural para quem viveu em Portugal e soube da ditadura de Salazar. Neste caso, valeu menos a história de Portugal e muito mais um manifesto contra todas formas autoritárias de governo.

Um certo Walldemorth é um bruxo cuja volta aterroriza o mundo dos bruxos. O bruxo do mal defende a idéia da bruxaria praticada somente entre bruxos de “sangue puro”. Um certo Draco Malfoi é um garoto que segue esse pensamento. Malfoi é loiro e debocha dos personagens que são pobres ou de “sangue ruim”, como os amigos de Harry, Ermionne e Ronny. Impossível não associar a idéia de “pureza” de sangue de Malfoi ao discurso nazista de “raça-pura”. Experimente trocar o nome de Walldemorth por Hitler e descubra que o mal é muito mais terreno do que parece no mundo da fantasia.

A história de Harry Potter prende a atenção por ser bem contada. É um anti-herói pobre e modesto. Seus amigos vencem pelo estudo, lealdade e ética. Para J.K. Rowling não é o sangue, a raça, a origem familiar ou a cor da pele que definem uma pessoa, mas sim o seu caráter. A autora soube contar uma história bonita e interessante, em que a mensagem deixada por Mantém Luther King não ficou desagradável. Muitas mensagens podem ainda ser tiradas de um mundo criado por uma escritora que demonstra preocupação ao escrever para crianças e jovens. Conhecer o mundo de Harry Potter é saber que lidar com crianças e adolescentes requer seriedade. Pena os autores de Malhação serem tão atarefados com enredos que visam despertar o consumismo, o sexo, o narcisismo e a superficialidade. Harry Potter também passa mensagens. Não sabemos se por sua origem britânica o faz com classe e elegância. Temos apenas a certeza de que ter compromisso com a ética e mensagens dignas não exige nenhum tipo de bruxaria. Ainda que se recorra a ela como pretexto em romances agradáveis e divertidos.
Muitas crianças e jovens de vários países aguardam a estréia do mais novo filme. Há adultos também. Entre pais, tios e tias, padrinhos e madrinhas estão adultos que admiram boas histórias. Sejam para diversão, sejam para posteriores palpites...