Monday, October 19, 2009

Uma porcaria chamada horário de verão

O horário de verão começou oficialmente no último domingo. Seus defensores juram que todo o transtorno é justificável, em troca de 0,5% de economia de energia elétrica.

Nada de campanhas para a população economizar em casa, cortando o desperdício.

A arquitetura copiadora de modelos estrangeiros continua a exaltar prédios sem iluminação natural.

Prédio públicos continuam com suas luzes acesas sem necessidade.

Absolutamente nenhum incentivo é dado ao brasileiro que reduzir seu consumo diário de energia. Nada de desconto para quem comprovasse uma redução no consumo.

Mas quem é que ganha com o horário de verão?

O turismo. As pessoas ficam mais tempo nas praias e nos bares. Aumenta o consumo de bebidas e sorvetes. Ah, sim, todos eles precisam de refrigeração. E energia economizada terá então alguma serventia.

Se você acorda cedo o problema de adaptação é seu. Como devem ser seus também o mau humor, a indisposição e até dores de cabeça.

As crianças que tem problemas para acordarem mais cedo que se danem. O aprendizado prejudicado pelo sono - que está no horário certo- é algo secundário.

Mas o Brasil vai economizar 0,5% de energia elétrica.

E a Ambev vai vender mais cerveja, a Coca Cola mais refrigerante e a Kibon mais sorvete.

Essas grandes empresas anunciarão na TV, com as crianças na sala.

E o noticiário sempre terá o cuidado de defender que o horário de verão é bom para todo mundo.

E todos nós seguiremos, em nome de 0,5% de economia de energia elétrica. Acordando uma mais cedo.

Bovinamente no horário.

E quem reclamar, que receba o rótulo de chato. Pois nem isso é mais possível: a discordância.

Saturday, October 03, 2009

3 de outubro

Algumas datas trazem tantas lembranças que acabam servindo para aguçar a superstição, como se a combinação entre números, astros e calendários tivesse realmente o poder de determinar alguns acontecimentos da vida humana.

O palpiteiro não acredita e nem duvida da relação entre datas e certas coincidências. Por conveniência simplesmente foge do assunto. E prefere a condição de provocador, ou seja, a figura do incendiário que inicia o desastre e depois finge que não teve nada com isso.

Mas a data de 3 de outubro sempre intrigou o palpiteiro. Foi em 3 de outubro que Getúlio Vargas iniciou o movimento que culminou na chamada "Revolução de 1930". Goste ou não de Vargas, ninguém negará que foi o líder de um período de fortes transformações da vida nacional. Para o bem ou para o mal.

Em 1953 Getúlio aprontou de novo, e para deixar claro que tinha o controle da situação, escolheu o 3 de outubro. Após uma árdua campanha nacionalista, na qual coube a curiosa participação de sindicatos, do partido comunista, do Exército, da UNE e até do pai do FHC, Getúlio assinou a lei do monopólio estatal do petróleo, assim como da criação da estatal que se encarregaria do setor no Brasil, uma tal de Petrobrás.

Um cidadão brasileiro teve uma namorada cujo pai trabalhou como office-boy da Petrobrás em 1954. Por influência ou pressão paterna, o então jovem abandonou a Petrobrás, acreditando que aquela empresa que ocupava apenas metade de um andar no centro do RJ pudesse ter futuro. O imbecil preferiu ingressar na Aeronáutica. Aposentou-se com a patente de subtenente. Enquanto hoje a Petrobrás é a segunda empresa mais lucrativa do mundo, com um valor de mercado superior ao do Google.

Em 1966 o 3 de outubro se destacou mais uma vez, quando o Congresso Nacional nomeou o General Costa e Silva como o segundo ditador do regime militar que golpeou o Brasil em 1964. Costa e Silva sucedeu Castelo Branco.

O general-presidente era tão bom de política quanto o palpiteiro de esgrima, e o país ingressou num processo de manifestações e repressão que estourou em 1968. No dia 3 de outubro de 1968 um estudante morreu em decorrência de confrontos entre estudantes da USP na rua Maria Antónia, opositores da ditadura (olá José Dirceu...) e estudantes do Mackenzie, defensores do regime militar (olá Bóris Casóy...).

Quebra-pau, gás lacrimogênio e cavalaria no prédio da USP. Vários professores aposentados à força e posteriormente exilados. Um anão chamado Fernando Henrique Cardoso, um gênio chamado Florstan Fernandes e uma das mulheres mais autênticas e doces que o palpiteiro já ouviu falando de política, Regina Sader, entre outros.

A ditadura acabou, o país teve a volta de um presidente civil chamado José Sarney. Em 1989, em eleições diretas, os brasileiros derrotaram um tal de Lula, preferindo um cara estranho e acelarado - no sentido colombiano do termo- chamado Fernando Collor.

A eleição de Collor é um capítulo a parte. E o palpiteiro prefere acreditar que foi um grande erro de um povo que havia desaprendido a votar. Sim, pois Collor foi eleito 29 anos depois das últimas eleições diretas para presidente. Até então, as últimas eleições diretas deram a vitória a Jânio Quadros, em 1960. Melhor dizendo, 3 de outubro de 1960...

Em 1992 muita gente se contentou com o impedimento de Collor na presidência, um palpiteiro inclusive. Alguns comícios reuniram mais de 1,5 milhão de pessoas, como o do Anhangabaú. Parte da imprensa, com Globo à frente, desprezava a possibilidade de afastamento de Collor. Um palpiteiro foi à manifestação no Anhangabaú e diante da multidão pensou: "... é muita gente contra um cara só. Acho que ele vai cair..." Collor foi afastado, muita gente comemorou e o Alexandre Garcia da Globo deve ter chorado copiosamente.

O afastamento do Collor foi no dia 29 de setembro de 1992. O mundo inteiro noticiou o caso como uma demonstração de civilidade, pois o impechmeant é um dispositivo presente em várias democracias ocidentais. Até então nunca utilizado. O Brasil foi o primeiro país a usar esse recurso. Afastamos um presidente que ficou impedido de concorrer a qualquer cargo público por 9 anos. O doido não precisou sair do Brasil, teve seu direito de ir e vir garantido, assim como sua liberdade de expressão. Collor chegou a dar algumas entrevistas nesse período. Não falou mais porque ninguém queria ouví-lo. Mas tinha esse direito. Acabou seu castigo e anos mais tarde concorreu e ganhou o cargo de Senador pelo Estado de Alagoas. Diga-se qualquer coisa contra ele, mas está no seu direito e a lei assim o permite. É com essa autoridade que o Brasil enquadra Honduras hoje. O mundo sabe disso e respeita o Brasil atualmente. Não apenas por Lula. Mas sobretudo pelo exemplo doméstico de política civilizada, apesar do Sarney ainda ser presidente do Senado...

Mas e o 3 de outubro, o que tem com o 29 de setembro de 1992?

Por alguns dias o Brasil virou notícia no mundo inteiro como exemplo de democracia sólida. Um país que afastou um presidente com respeito às leis e sem um único tiro. E com milhões de manifestantes nas ruas nas maiores cidades.

Até o dia 2 de outubro fomos admirados. Mas no dia 3 a imprensa noticiou um massacre contra presos na penitenciária do Carandiru. Oficialmente - oficialmente- foram mortos 111 presos, numa prática bárbara, com o uso desmedido da violência. Em 3 de outubro de 1992 o Brasil teve que se explicar perante o mundo civilizado por uma clara demonstração de afronta à idéia de um Estado de Direito.

Hoje é 3 de outubro de 2009. Os jornais noticiam a escolha do Rio como sede dos jogos olímpicos de 2016.

O ambiente no país é de uma tranquila felicidade. Há aqueles que acham que tudo dará errado e que seremos roubados em contratos superfaturados. Mas a grande maioria sorri. Paulistanos felizes pelo sucesso internacional do Rio não é algo para se desprezar.

O palpiteiro desconfia que o 3 de outubro possa pregar alguma peça, pois estamos apenas há pouco mais da metade do dia.

Mas ao mesmo tempo prefere curtir a sensação de que o 3 de outubro também oferece coisas boas. Como qualquer outra data...