Thursday, March 14, 2013

Jorge é agora Franciso. Não é tolo e nem argentino

Conta-se que, durante a construção de Brasília, muitos embaixadores de países amigos procuraram as autoridades brasileiras para a compra de terrenos na nova capital. Os EUA foram os primeiros a fazerem sua proposta. Mas foram os terceiros a conseguir. Em primeiro lugar ficou o Vaticano, em segundo Portugal. A maior potência econômica e militar do planeta  foi deixada em terceiro plano, após um país pequeno da península ibérica e de outro que nem exército tem. 

Conta-se também que durante a ditadura brasileira o exército não temia quase nada. Reprimiu guerrilheiros, torturou, matou e ocultou os cadáveres de opositores. Aposentou professores universitários, bateu em operários e deu tapa em estudantes. Mas foi muito cuidadoso em relação a instituição mais respeitada pela ditadura civil-militar: a Igreja Católica. No início da década de 1970 um grupo de cardeais se reunia secretamente com um general muito católico, afim de manter as boas relações entre o exército e a Santa Igreja Católica no Brasil. O palpiteiro já viu fotos de um desses encontros, ocorrido em Petrópolis, RJ. 

Assim é a Santa Igreja na América Latina. Não tem a força das armas, mas das ideias, dos valores e do medo do inferno. Ademais, possui um dos maiores serviços de espionagem do mundo, em especial nos países de maior presença de católicos. O que um católico não diz no trabalho, entre os amigos ou a família o faz para o padre, pessoa de alta confiança em muitas comunidades. Qualquer paróquia é um centro de coleta de informações sociais, econômicas e políticas. Padres conversam com bispos, que conversam com arcebispos. Que se reportam a Cardeais. Que elegem Papas...

Em latim, Cardeal quer dizer "principal". Ninguém chega a esse posto se não for da mais estrita confiança da Santa Igreja. Uma instituição que nascida no Império Romano, que cresceu na Idade Média, resistiu à Reforma Protestante, à revoluções socialistas e duas guerras mundiais. A Santa Igreja é assim. Possui uma estrutura econômica, política e moral que ultrapassa o tempo e o espaço. 

Ninguém que tenha juízo briga com a Santa Igreja. Em 1989 os EUA invadiram o Panamá, com a missão banal de prender o presidente da República. Noriega, ex-colaborador da CIA, se refugiou num prédio da Igreja. Que negociou sua entrega com os EUA. 

Golpes de Estado e tentativas de Golpe contaram com a participação de parte do alto clero católico. Ditaduras também foram derrubadas com a participação de parte desse mesmo alto clero católico. Ascenção e queda de governos raramente ocorreram sem a participação direta ou indireta de autoridades da Santa Igreja. 

O novo Papa nasceu na Argentina, o que não quer dizer que continue a sê-lo. Foi-lhe dado o nome de Jorge, desde ontem tornado Francisco. Jorge não foi escolhido ao acaso. A Argentina é ainda um país de maioria católica, assim como o Brasil, México e a maior parte da América Latina. Naquele país, Jorge, hoje Francisco, foi sempre leal à sua Igreja. 

Conta-se que durante o sanguinário regime militar argentino ele foi hábil para jogar nos dois lados. Incentivou católicos da Teologia da Libertação ao mesmo tempo em que não atrapalhava a sua perseguição. Dizem que fora leal a pessoas de lados em conflito. Se agiu dentro da moral católica ou não, apenas ele e Deus devem saber com exatidão. 


A Santa Igreja tem um sério problema político para resolver. Suas riquezas estão concentradas na Europa, onde a perda de católicos tem sido forte, há mais de 5 décadas. A maior comunidade católica do mundo está na América, sobretudo latina, mas com minorias significativas nos EUA e Canadá. O dilema político é simples. O lugar onde há mais católicos não tem tanto poder de decisão política e econômica no Vaticano. O lugar onde há maior perda e crítica à Santa Igreja concentra o poder.

Um Papa da América não representa necessariamente uma vitória do continente ou um ganho de força na estrutura do Vaticano. A maioria dos cardeais com direito a voto é europeia. Dificilmente Francisco I mudará o Vaticano sem a anuência deles. 

O Papa é um rei de uma monarquia não hereditária com sucessão eletiva. Como chefe de Estado, um Papa atende aos interesses do que governa, não do país em que nasceu. Maldizer a escolha de um Papa nasicdo na Argentina é tão estúpido quanto comemorar uma eventual escolha de um Papa brasileiro. 

Jorge, hoje Francisco era Cardeal. Hoje é Papa. Há muito tempo que não é mais argentino.       

1 comment:

Caio said...

O novo Papa com certeza deixou de ser argentino há tempos, mas isso não tira o orgulho dos argentinos (de uma certa forma ferido há algum tempo). Me pergunto o que a eleição desse novo Papa pode representar para a Argentina nesse momento.