Monday, January 14, 2013

Os gatos pingados da Paulista

Qualquer um que conheça um grama do que tem sido o Brasil nos últimos 20 anos saberá que forjamos três formas de pensar a respeito de política: os que admiram Lula, os que o odeiam e os que não se importam com sua existência, sucesso ou fracasso. 

Diferentes palpiteiros eleitorais têm apontado para números que fazem algum sentido quando olhamos os resultados eleitorais. Acreditam que uns 30% apoiem de fato Lula, uns 30% o detestem e uns 30% oscilem de acordo com as circunstâncias do momento. 

Se considerarmos os três últimos resultados eleitorais, 2002, 2006 e 2010, é razoável acreditar que os indiferentes se uniram aos simpatizantes, deixando os odiosos com pouco mais de 35%. 

Se considerarmos os resultados anteriores, 1989, 1994 e 1998, teremos que aceitar que os indiferentes se uniram aos raivosos contra Lula e o PT.

É por isso que as manifestações políticas contra Lula ficam engraçadas quando seus militantes mais exaltados definem o sucesso eleitoral de Lula e do PT das últimas eleições como resultado da "burrice do povo". O argumento é singelo,  pois desconsidera a própria lógica da burrice. O mesmo eleitorado que votou em Lula e no PT nas últimas 3 eleições o fez contra nas 3 anteriores. A burrice é então eventual ou apenas falta de argumentos mais consistentes?

O dia de ontem foi histórico. De acordo com a Folha de SP, cerca de 20 pessoas organizaram uma manifestação "contra Lula e o PT e em favor da honestidade". 

A conhecer a seriedade e a competência da Folha de SP com números, é seguro acreditar numa margem de erro de 10 manifestantes. O palpiteiro acredita em no mínimo 10 e no máximo 30 deles...

Mas o número dos herois da resistência a Lula não traduzem nem de longe a realidade de quem não gosta de Lula e não suporta o PT. 

Na cidade de SP, os que não votaram no PT nas últimas eleições somam, tranquilamente, milhões de pessoas. Nem todos babam de ódio ou podem ser classificados como "fascistas  manipulados pela coligação veja-globo-folha-estadão". Muitos simplesmente não concordam com as propostas, o discurso e a forma do PT governar. Tem toda a legitimidade para isso, num sistema pretensamente democrático. 


O que surpreende é notar que mesmo entre os militantes mais hidrofóbicos não houve condições de organizar ao menos 5.000 pessoas na avenida Paulista contra Lula e o PT. Quem mora em São Paulo sabe que há muito mais raivosos do que isso. 

Mas por que não conseguem se mobilizar aqueles que mais se incomodam contra Lula e o PT?

O palpiteiro acredita que são vítimas do próprio discurso. Acostumaram-se a rotular manifestantes de baderneiros. Poucos titubearam no apoio à repressão da Tropa de Choque contra grevistas, professores e militantes nas ruas do Brasil. 

Para quem acredita que pessoas que se manifestam estão sempre a agir como zumbis de sindicatos ou partidos políticos fica mesmo difícil acreditar na capacidade real que uma mobilização de manifestantes nas ruas pode provocar. 

O palpiteiro jamais se colocará contra o direito à manifestação daqueles que o fazem sem violência. Mesmo que pense em contrário. 


Mas não custa nada aos raivosos aprender algumas lições:

- mobilizar pessoas requer capacidade de liderança e organização

- uma causa comum é sempre importante, mas principalmente com um objetivo mais específico

- colocar-se contra o direito de manifestantes que pensem o contrário de você pode ter o efeito contrário: desacreditar as manifestações pacíficas de rua como instrumentos legítimos da democracia.

- esperar a mobilização de milhares de pessoas e contar com apenas 20 delas não é motivo para desânimo ou raiva. Antes de tudo é preciso fazer um balanço do que deu errado e POR QUE deu errado. Humildade não faz mal a ninguém. Nunca. 


São lições básicas que pessoas interessadas no livre exercício da democracia aprendem fazendo. Não há livro ou curso de formação política que ensine isso tão bem quanto a própria experiência e perseverança. 


O palpiteiro se solidariza com os 20 gatos pingados que dignificaram a luta por um Brasil "mais honesto e sem Lula e o PT". Por isso, recomenda a observação daqueles que já se mobilizaram no passado. Estudar a liderança de Lula como político, ao invés de demônio, pode ser um bom e significativo passo nesse aprendizado. 

Aqui, o link da histórica e retumbante manifestação

http://www1.folha.uol.com.br/poder/1214302-protesto-contra-lula-e-pt-reune-20-pessoas-na-avenida-paulista.shtml



6 comments:

elias said...

Algumas considerações que poderiam ser feitas:
- o Lula foi "aprendendo" a falar na TV e as estratégias de marketing no sentido de criar o mito começaram a surtir efeito (o suficiente para poder aparentar confiança para essa massa "indecisa" e burra sim; talvez a mesma que colocou o FHC e que continuou insatisfeita).
Um líder sindical não é necessariamente uma inspiração para o brasileiro comum.
- E sobre o número insignificante na passeata, por um lado seria interessante lembrar que as passeatas "mais badaladas" são sempre organizadas pelas mesmas pessoas e grupos (universitários e de esquerda). E isto acontece porque a direita é desorganizada, fútil e/ou simplesmente é formada por gente de fora do meio acadêmico, ou que trabalha ou que ainda não percebeu que precisa lutar por suas convicções. Basicamente uma parcela grande da direita se "despolitizou" ingenuamente. Enquanto a esquerda se organizou. Neste ponto acho que você acerta. Mas com algum tempo palpitando sobre seus palpites, percebi que estava me desanimando em perceber que quando é pra criticar o PT você puxa o freio de mão. Entendo a dificuldade, mas é perigoso quando se coloca o partido acima do país.

Sérgio de Moraes Paulo said...

Elias,


seus argumentos são muito interessantes. A esquerda consegue se mobilizar melhor porque não trabalha. Ao contrário da direita.

Sou limitado e tive dificuldades em pensar em tanta gente de direita a trabalhar num domingo, dia da tal manifestação...

Quanto à minha parcialidade, não se chateie. É assumida. Se você acha perigoso ter uma preferência política, proponha a proibição do sistema plural de partidos de nosso país.

Cada uma...


Abraços e boa sorte na organização dos trabalhadores da direita que não descansam nem no domingo...

elias said...

hahah, poxa vida, voce quis dar uma de bahktin e pegou o termo "ou trabalham" e a partir disto desceu-me o pau. Me desculpe se o ofendi. Mas entendo a revolta, já que este é o argumento básico de quem não apoia manifestações. Devia ter levado isto em conta e me expressado melhor. Enfim, não tenho como provar mesmo a minha tese de que as grandes passeatas são formadas em sua maioria por estudantes (não estive em muitas).

De todo modo, não me tira as verdades sobre o Lula e a desorganização da direita. E com direita não quero dizer totalitarismo, coronel telhada, violação dos direitos humanos e etc. Aliás, esse é o ponto que eu ressaltaria, a sua "preferencia" política abre algumas concessões morais. Brincando de Bahktin também, voce dizer "preferencia" é uma mera suavização...enfim, como leitor eventual do seu blog há um tempo considerável, quis dar meu palpite

abraço (sem ironia e ressentimento)

Sérgio de Moraes Paulo said...

ELias,


adoro conversar com pessoas que têm certeza a respeito de "suas verdades"...São sempre muito interessantes. Gostaria de ser assim.

Agradeço a leitura eventual.

Abs

elias said...

Não me considero uma pessoa tão convicta assim (provavelmente bem menos que vc)...e não creio que chegamos perto de conversa. Mas agradeço a disposição de responder e publicar. Abraço

Anonymous said...

Otimo texto. Palpitero, vc podia falar um pouco da situação atual do Mali para dar uma clareada, abraços e continue com o otimo trabalho