Saturday, May 28, 2011

O voo 447 e a conveniente culpa dos pilotos

No dia 01 de junho de 2009 o Brasil ficou triste com a queda de uma aeronave da Air France que matou 228 pessoas, no acidente conhecido como "a queda do voo 447".

Para além da tristeza dos familiares e amigos que sofrem com a perda das vidas, um acidente aéreo é sempre uma oportunidade para aprimorar procedimentos e práticas que contribuem para que outros não ocorram. Qualquer pessoa que tenha segurança em uma viagem aérea deve isso, em parte, aos estudos e conclusões dos acidentes que ocorreram no passado. As vidas perdidas de outras pessoas acabam por proteger as nossas. É também por isso que devemos o respeito aos que se foram em acidentes aéreos. Passageiros, tripulação e vítimas em terra.

O voo 447 trouxe elementos adicionais para um caso que deveria seguir o padrão de todos os outros. Apurar as falhas, avaliar os erros, apontar responsabilidades. Punir eventuais culpados.


Mas algo de estranho tem acontecido. As autoridades francesas demonstraram um interesse para lá de curioso no episódio. Gastaram muito dinheiro e tecnologia para recuperar a caixa-preta do avião. Ao mesmo tempo, a Air France tem se desdobrado para provar que não teve responsabilidade na falta da troca de equipamentos que poderiam ter contribuído para a queda do avião.

O caso está prestes a completar 2 anos e especulações surgem numa direção perigosa, a saber, a responsabilização do piloto e de seus co-pilotos.


Culpar um piloto por um acidente sem sobreviventes é sempre um recurso conveniente àqueles que de fato deveriam ser responsabilizados. Pilotos mortos não podem se defender. Isso livra a cara de quem deveria ser enquadrado como responsável, negligente ou culpado.


A Airbus, fabricante do avião que caiu, tem sido acusada com frequência por defeitos de concepção de engenharia que na prática colocam as vidas das pessoas em risco. Apenas para lembrar, desconfianças também recaíram sobre a Airbus na queda do avião da TAM em Congonhas, São Paulo.


Alguém muito maldoso poderia insinuar que há algo de estranho nesses acidentes em que a Airbus é acusada de erros de fabricação e que nada acontece para ela. A fábrica fica em Toulouse, França. Admitir que alguns modelos da empresa não são seguros é o mesmo que pedir para que as companhias aéreas de todo o mundo não comprem seus aviões.


Não é conveniente para a Airbus que eventuais falhas de fabricação sejam provadas. Não é boa notícia para a França ter uma queda de vendas da Airbus, pois isso significaria menos empregos, menos impostos e a perda de mercado para a concorrente dos EUA, a Boeing. Numa época em que a economia na Europa não vai nada bem.


Tem muita gente com altos salários na França torcendo para que a culpa do acidente do voo 447 recaia sobre a tripulação. E gente maldosa diria que a o governo francês daria uma força para que isso ocorresse. O palpiteiro jamais acusaria o governo de um país amigo e soberano de manipular informações que afetam seus interesses políticos e econômicos. Governos não mentem, nunca. E em nenhum lugar do mundo. Governos não mentem quando há vidas humanas em discussão...


Para não deixar de seguir no seu compromisso com o absurdo a revista veja- aqui sempre com minúsculas- deu mais uma das suas. Na última edição a dita revista surpreendeu mais uma vez. Usa de todo o seu sensacionalismo para forçar a tese de que a culpa foi dos pilotos. E o mais inusitado: brinca com a tragédia alheia ao estampar o pânico da queda de um avião com técnicas de HQ. Na capa.

O caso em si já causa constrangimento. Uma revista como essa, náusea.


Sobre o indiciamento da Airbus na justiça francesa:



Vale a pena saber o que o sindicato do pilotos tem a dizer sobre o caso:



1 comment:

Giu said...

Bom, não sei até que ponto dispender tecnologia e dinheiro para a recuperação da caixa preta demonstra que a Airbus possa ter falhado na produção. Se eles recuperarem e o indício for de falha mecânica tudo pode piorar.
Porém como o sr mesmo disse, é sempre bom e devemos agradecer a estas pessoas por tornarem os voos diariamente mais seguros. Mesmo que isso seja para eles um mero negócio, ou que seja por medo de perder um grande negócio, isso previne vidas de se perderem.